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POESIAS

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MEMÓRIA

Fatos não existem.
Palavras sim.
Histórias também.
Fatos não existem. 
Memória, história.
Fatos, fotos, ninguém.
Palavras significam.
Sons articuláveis.
Passados incontáveis.
Inventa-se tudo.
Inventam-se folhas. 
Ao vento um caminho lento.
Suceder, esquecimento.
Histórias, caminho lento.
Bem devagar, vagando 
ao infinito.
Nossas narrativas,
boas ou não,
prejudicam bastante
nossos sonhos,
nossas esperanças.

GUERRAS: NOVA ORDEM

Sempre mentira.
Verdade se dissolve
em outras mentiras.
Gente contra gente.
O homem contra o homem.
Perverso vale-tudo.
Estúpido nós contra eles.
Agora a civilização faz 
buracos, faz sofrimento.
Faz dores.
Voam, mortes, sofrimentos, 
sobre esperança desintegrada.
O amor foi para o lixo.
O horror habita tudo.
Corações apodrecem.
Ideias, bem longe das verdades.
Vitória insólita da mentira.
Liberdade. Marcha unida.

DENTRO?

O melhor está em nós.
Nossa cabeça, nossa ideia.
Desejo, esperança.
Se cai ou se dança.
Lembrança, vencedor.
Respirar, sentir-se bem.
Critérios, sempre os
critérios sem cartórios, 
nosso bem.
Amarelo, verde, anil,
o mundo nosso cio.
O tempo passa.
Logo, quase tudo
senil - senescência e abandono,
quase tudo sem dono,
vagamente o cio…
o vazio. Uma cabeça confusa
aciona um corpo
em direção estranha.
No jogo só se ganha.
Direção pobre, nobre,
tamanha.
A cabeça confunde 
todo erotismo.
Chega perto do abismo.
Alto, bem alto,
o confuso cinismo
cria terremoto, sísmico.
Nem a escala Richter 
dá conta do abraço.
Dá conta de tanto
movimento.
Eu lento, nem sei 
o que procuro.
No clarão, no escuro,
busco algo.
Que nem sei.
Amei ter tudo,
no arquitetônico 
estudo, que nem sei.
Tropecei em mim,
eu rei, não sei,
assim caminho.
Entristecido jardim.
Apocalipse no fim.
Balanço cênico
em mim.
Digo não e não,
querendo dizer sim?
Forte o cheiro 
do Jasmim.

Você não é Pedro.
Você não é pedra.
Você é muito e muito.
Nosso grande amigo Zé.
Habitou nosso universo
sempre driblou o adverso
hoje sem prece, adormece.
Sabe de mais verdade
Voando na eternidade.
E claro, nos deixa saudade.
Amigo e silêncio.
Amigo e soluços.
Muitas estórias com alegorias,
contava no carro, no bar,
nas pescarias.
Hoje entre estradas 
pareço ouvir suas grandezas 
Na fantástica aventura
de dizê-las.
Nosso eterno amigo Zé.
A cada noite:
Dr. José Reinaldo.

SILÊNCIO?

forte barulho
desmorona silêncio.
Temor da alma,
morrer-se na calma.
O barulho cresce.
Ultrapassa todos os limites.
Faz nos ouvidos,
um tempo caótico.
Anedótico pulsar de sons
agora, silencio.
É utópico.
Depressa nosso interior
menoscaba nossos ouvidos.
Ruídos pelos sons,
maltratados pela lógica
do modernismo.
Abismo de cada um.
Barulho pesado.
Absoluto enfado.
Absoluto. Barulho,
barulho, joga fora
nosso orgulho,
nossa vontade
sem maldade
no silêncio.
Este sempre caminha
longe.

Carlos Roberto Aricó

MORRER-SE

Morrer-se, devagar.
Sobrevivência: imbecil.
A natureza biológica ganhou.
Aprende-se, morre-se um pouco,
na morte dos outros.
Sempre pequenas mortes.
A nossa: sempre terrivelmente grande.
Detalhes são introjetados,
causando alguma dor. Às vezes, nem percebemos.
Existem faltas.
Lembranças teimosamente sobrevivem
fora do tempo imperturbável, o absoluto.
Nossa ansiedade cresce
e nossa morte, terrivelmente devagar às vezes,
vai assustando tanto e fica próxima.
Muitas coisas feitas com palavras.
Sons, vogais, articulação: explodem.
Escapam do invisível tempo.
Escapam da vida, da dívida.
4 A realidade ultrapassa
qualquer vocabulário.
Poesia impossível em metafísico dicionário.
_____

Tesão e ternura.
Noite bem escura.
Aproxima-se loucura.
Longe, estranha procissão de escombro.
Luta cruel,
luta de alma em luto,
ombro a ombro.
Mundo repleto de ausências.

Carlos Roberto Aricó

NA CIDADE

Se você constrói na cidade,
uma vida ou verdade,
sem trazer felicidade,
só muita imitação,
em contexto covarde,
escapou ileso da mediocridade.

Cada falta de reflexão,
transgride a imitação.
Cada ação mobilizada,
transforma tanta desrazão
em quase nada.

Com dificuldade
se constrói na cidade.
fazendo tanto alarde
onde arde desilusão.

Cidade vazia,
caminha ironia,
arde desilusão.


Carlos Roberto Aricó

AQUI.

Estamos aqui, criatura.
A mesmice da ditadura.
Aumentando temperatura.
Caminhando em ruas tortuosas,
sem vontade, sem candura,
percorrendo coisas virtuosas,
sob o manto de metáforas,
nada sobre nós revela
água pura.
Nem tão longe nossa sepultura.
Perto, bem perto varredura.
O outro, do outro, ao infinito
Se mistura.

Carlos Roberto Aricó

PREÇOS

Custo de vida,
nas alturas!
Os homens, as mulheres
aturam.
Custo de vida alto,
até nas sepulturas.
Crianças sofrem.
Todos e todas sofrem.
Desjejuns, sortes.
Seria melhor a morte?
Nunca o sonho.
Onde tudo e tanto
começa ou acaba.
Inclusive nosso pranto!

Carlos Roberto Aricó

HOJE?

Procura-se memória perdida no tempo.
A dor colossal.
Parte metafísica, do compasso sideral.
Escuridão, sombra, alfombra de nada.
Não há significação, nesse tempo.
Sem retorno, nada entorno.
tremor, medo, esquecimento.
História e estória, fugaz momento
Espantoso pensamento.
Lugar vivo, passatempo.
esquisito fingimento.
O tempo morre, ausente
o relógio.
Longe, o pressentimento.
Distante qualquer tormento.
Paz, só em paz
tudo caminha.

Carlos Roberto Aricó

Não desisto.
Nem sei de que.
Até insisto.
Na solidão e no ódio,
misto.
Nada de pódio,
inglória corrida.
Misto.
Perdendo a vida.
Na dúvida.
Na dívida.
Bola dividida.
Não desisto.
Agora até insisto.
Agora, até a vitória,
brinco com a glória.
Mas, nunca desisto.

Carlos Roberto Aricó

ALÉM

Braços, peitos,
pernas, rostos, lábios,
tudo me ultrapassa.
O tempo ainda não.
Assim oscila entre a vida,
morte.
Insisto, como insisto.
Daqui a pouco
desapareço.
Renasço, nem sei.
Se não sei renasço.
Para quem? Por quê?
Sei lá, nunca sei o que
é bom de verdade.
Saber … saber … enche.
Tropeço no instante,
no Deus ausente.
Pranto, só o pranto presente.

Carlos Roberto Aricó

POESIA

Poucas palavras.
Deusas, concentradas.
História navega
mar calmo, provocador.
Alegrias, dor.
Ardor, fogo calmo.
Calota polar
invade o mar.
Pouco diz tudo,
diz nada.
Um mundo começa
e acaba.
Verso adverso,
pedaço de universo
palavras de aço.
Compasso de tudo e nada.
Vitória ou fracasso.

Carlos Roberto Aricó

GENTE

Olhos vermelhos.
Sem euforia.
Ausência, imperfeição.
Desejo de viver à margem.
Inóspita, civilização.
Contradição eterna.
Terna enunciação.
Habitada por melancolia,
macia ao tato.
Só leveza, alma,
calma, serena,
na poesia,
cotidiano.
Dia a dia?
Choro e chôro.
Mesmo triste, absorto.
Vivo, não morro.
Atento, não morro.


Carlos Roberto Aricó

AUSÊNCIA

Saudade, saudade.
Minha alma invade.
Nada sei quem me cabe
só e só a saudade
saudade.
Que no corpo
e na alegria
arde.
Noite, dia,
nessa tarde saudade.

Carlos Roberto Aricó

MUDANÇA

Trabalho do tempo
incansável.
Agônico tormento.
Cada porta
fechada.
Sempre fechada.
Aberta: o nada.
O vazio desaba.
Outro lado:
mesmice.
Eterna tolice.
Sempre, sempre,
o mesmo.
A esmo mais um nada,
e nunca se acaba.
Cronos em pé
nunca desaba.

Carlos Roberto Aricó

Inventa-se tudo
e tanto também.
Sobra da vida o amém.
O pai, o filho e o espírito
procuram o refém.
Meu egoísmo, abismo
e ninguém.
Solto no ar,
solto no mar,
meu nefasto inventar.
O tudo o tanto,
a escrita da vida,
divagar.
Infinitude sem lugar
tenho pouco a decifrar
Discurso, verdadeiro discurso:
não há palavras para falar.
Não há palavras para pensar.
Infinitude ou luar.
Pouco a decifrar.
Não há palavras
para falar.
Nem significações
para o pensar.

AINDA

o povo, a posse, o poder:
semântica contraditória,
entre ditos e história.
A pausa, o pulo, ocaso
sem pose, na posse de nada
e tudo, e tanta coisa desaba.
O inútil começo,
sabe-se que acaba,
no nada de sempre,
presente, presença
e ainda se pensa.
Nessas horas,
infelizmente.

Carlos Roberto Aricó

CAMINHO

Tresvariando em vida
como sonho.
Em quase nada
me disponho.
Enfadonho
Jogo de palavras
Enfadonho
não digo nada.
Nem sei onde
o mundo, imundo
começa ou acaba.
Muita coisa da vida
acaba.

Carlos Roberto Aricó

O PASSADO

Vida doida.
Vida doída.
Dias bons,
outros indiferentes.
Muitos ultrapassam tempo.
História doída, doida segue.
O que consegue?
Julgamento, sempre indeciso.
Verdades voam!
Julgadores também voam.
Eternas indefinições,
nas várias ações.
Tempo e contratempo
buscam hora exata,
mapa de utópica geografia.
Nem antes o mundo existia.

Carlos Roberto Aricó

PSIQUISMO

Limite do vazio.
Observa-se nada.
Metáfora, ausência.
Memórias ativadas.
Páginas, psiquismo
desarrumados.
Limite. Estalagmite.
Estalactite.
Cavernas na alma.
Na busca se acalma.
Memórias ativadas,
alvoradas.
Lágrimas eternas.
Observa-se o vazio,
desvario, rio ilimitado
de águas bem transparentes.

Carlos Roberto Aricó

UMA MULHER

Certo desejo voa.
À toa, de janela possíveis.
O certo e incerto voam.
Imaginação, sonho, delírio.
A vontade voa.
Atravessa rua e ar.
Mulher muito vestida.
Agora nua, parece olhar tal lua.
Desejo, volúpia, voa.
Busca-se no tempo,
tempo do encontro,
tempo da ternura.
Ela, pura ou impura,
É vista como nua, no brilho
poético da lua.
No etéreo volátil da rua.

Carlos Roberto Aricó

ARANHA

Um corpo sua.
Minha voz é tua.
Você nua,
naufraga em mar,
meu mar em seu olhar.
Longe, minha lua.
Você vestida, pura.
Meu mar anseia
sua voz nua.
Você e você
na sacada do querer.
Ser eu, sua sereia,
pisar de minha areia
sou sua aranha,
desejo prisão em nua
teia, longe minha lua.
Mais longe, minha rua.

Carlos Roberto Aricó

CAMINHO GELADO

Imensa brancura.
Ursado, no azul cercado,
branco caminho gelado.
Iceberg morrendo, descuidado.
Desventuras ursado.
O mundo todo desabado.
Busca-se calor, calota gelada.
Até servir nada, com calor,
Zigzag mesclado, ao nada.
Ursamente vazia.
Nem silêncio, nem eco.
Silêncio, branco e azul.
Imensidão gelada, mais nada.
Parece um mundo que acaba.

Carlos Roberto Aricó

PEDRAS

Outra linguagem:
pedras, poesias, palhaços.
versos e rimas.
Relógio tombado.
porteiro enferrujado.
Outro, o outro do outro.
Metafísico calendário.
Passos, espaço ausente.
Passo solene.
Pedras imóveis, parindo silêncio.
Não há pegadas, nem futuro.
Sol, samba e escuro.
Alma, muro de nada.
Nenhum barulho acaba.
Entulho nenhum desaba.
Poesia só pedras parindo
silêncio. Muito imóveis.
Mesmos lugares.

Carlos Roberto Aricó

OUTRO LADO

Olhares distantes,
aves, sem peso.
Mais nitidez, antes.
Indefeso.
Míopes entre ver tudo,
contudo, nada vê
como antes.
Desejo, hoje pequeno.
Aceno, cotejo.
Sem manejo.
Com olhar preso.
No passado,
gracejo ultrapassado.
Tremor, enredo.
Angústia, medo.
Surpreso. Nada aceso.
Nadar-se sem rio:
desaba mais um cio.

Carlos Roberto Aricó

ALGUNS CONTRASTES 2

Morte ou dinheiro,
polos da mediocridade.
Vida dos contrastes.
Guindastes suspendem vazio.
O nada, não significado.
Bem-acabado, palavras.
Lavras, esforço.
Alvoroço contínuo.
Presente: dor, solidão.
Inconformismo.
Vida do jeito que for.
No brilho, sem trilho,
grotesca escuridão.
No caminho e no chão.
De longe, muito distante,
uma fraca razão,
nossa forte verdade:
liberdade!

Carlos Roberto Aricó

DESVIO

O vivo está à deriva.
Como sempre.
A morte, perto.
Estupidamente perto.
Fazer o quê?
Seguir regras possíveis.
Acompanhar o sabido.
À deriva, foge controle.
Do controle evitável?
Nunca se sabe.
Vamos tentar.
O acaso está aí.
Fazer o quê?
O possível, o impossível,
qualquer coisa.
Ainda.

Carlos Roberto Aricó

ESTRANHO

Um mundo parado.
Sonho, não há tempo.
Nada de espaço.
Sem compasso, sem paço.
Sem posse. Nem pose.
Nenhum passo.
Silêncio.
Sonho ou pesadelo?
Tanta gente.
Nada presente.
Precente-se enredo.
Mesmice e medo.
Alvorada forte.
Cimo de vida eterna.
Sem norte, sem porte,
a noite chega outra vez.

Carlos Roberto Aricó

ALGUNS CONTRASTES

Morte é reencontro,
abençoada morte.
Porto feliz, encontro
vários tantos meus.

Se morte for esquecimento,
sem memória, sem desejo,
prece ou sono sem fim.

Eterno assim.
com dor, pior.
Sem dor parece boa,
À toa, não sei,
ainda.

Novo caminho.
Resta caminhá-lo.
Um novo caminho,
encolhido.

Posso escolher, liberdade.
Sempre, se possível,
é claro, no escuro
de tanta gente.

Carlos Roberto Aricó

BRINCANDO:

Às vezes, brumas, incertezas
escapam dos abismos do silêncio.
Pensamentos tornam-se espumas,
insolúveis, diluídas.
Brisas escapam
pelos dedos angustiados.
Leveza transparente,
dia a dia.
Amorgrafia, sonho e
pesadelo.
Dorgrafia complicada
pelo não.
Incerta melancolia
fingindo poesia.

Carlos Roberto Aricó

VIDA

Crispa e fagulha
paixão abrasadora…
causa muita dor.
Até quando?
Cinzas emergem do fogo vencido,
que sem sentindo,
já não queima mais,
e nesta vida tão sem vida
diminuam os ais
gritos, nunca mais.
Mais…
até quando?
Tudo tão demais.

Carlos Roberto Aricó

TUDO BRANCO

Angústia, branco papel
Inferno e céu
atormentam meus dedos.
Palavras, apelos
transtornam meus dedos.
Rápido o movimento.
Triste sentimento.
Papel branco, muitas ausências.
Impertinências na alma.
Condolências ao silêncio
desafinado silêncio
brotando no mundo
palavras, silêncio, eco.
Vazio o som, sem tom.
Tudo quieto, tanto sem eco.

Carlos Roberto Aricó

QUEIXUME

Ciúmes.
Dentro do ser.
Queixumes.
No altar de tudo:
os cumes.
Dentro do ser:
dor.
Bem dentro,
alma sem cor.
O outro, os outros,
queixumes,
a dispor.

Carlos Roberto Aricó

SÍNCOPE

Tudo passa por mim.
Pulo sobre o destino,
caminho, é ruim.
Vai assim.
Na avenida, entre
flores e jardim,
passando nesse passeio,
anseio o tamborim.
Um samba eterno
no fim.
Das síncopes desesperadas,
tão esperadas em mim.
Ando sempre assim.

Carlos Roberto Aricó

?

O trânsito.
Transito, lugar
bem esquisito.
Persisto ao saber

Insisto, ao saber do rito,
esplendor do circo.
Não tem jeito:
peço pinico.

Continuo aflito.
Descrito, bem descrito,
esse mundo interno
hoje infinito.

Carlos Roberto Aricó

ONDE

Volto, até consternado,
para onde sempre estive.
Lugar do medo, coragem,
morte, esperança.

Volto bem mais velho.
O tempo roubou minha juventude.
Os anos roubaram a vida adulta.
Volto bem mais velho,
jogando fora calendário.
Fazendo-me moço, outro cenário.

Volto mais velho e antigo.
Fiquei com tudo.
O meu também. O que acreditei meu.
Tentos desígnios meus.
Incrédulo, à procura de Deus.

Volto com sabedoria própria.
Pouca inveja. Aspiro, céu.
Feliz, esse destino.
Contente o desatino.

Volto para onde sempre estive.
Sorriso, lágrima.
Ternura e ternura.
Nada de violência,
nada de sangue.

Alma pura, impura.
Exangue, gravita.
Entre lagoa e mangue.
Dividindo o ser no meio
entre ter e o não sei.

Navegam meus sonhos,
crianças, homens, mulheres.
Habitam devaneios.
Os lados, no centro os meios.

Anseio, sofro nos seios.
Anseio e sofro revelações.
Inventadas, bem inventadas.
Volto para onde sempre estive.

No mundo, tristeza.
Alegria.
Vida, invento mais
um dia.
No contratempo,
mais um dia.

Carlos Roberto Aricó

ORDEM

Lirismo sem sentido dos loucos,
tão consentido nos amantes.
Lirismo libertação, viagem.
Voragem, desenganos.
Prisão dourada, contendo grades.
Lirismo constitucional, burocrático.
Grades, grades ordeiras: leis
Progressistas, douradas.
Fora e dentro:
prisão, muros, ordens.
Ordens perenes, classistas.
Eugenia, classe.
Alegria, impasse.
Ordens perenes.
Eternas limitações
Ações sem liberdade:
leis absurdas.


Carlos Roberto Aricó

UM POEMA

Palavra pensada.
Leve pluma, ou folha.
Associação: poemas
fonemas sem direção.
Fonemas voando.
Silêncio, vale a pena? Vale apenas?
Quietude em cena.
Convento, fechado ao vento.
Atento, tento, tento, não consigo.
Persigo o acaso, chão raso.
Ocaso livre e desilusão.
Vocábulo, movimento.
Entre chão, firmamento.
Clarão de lua, nua, minha, nossa,
sua, sofrimento.
Sentimento leve.
Atento, há tempo, tento.
Mais um poema no muro do convento.
Não vejo freira,
mas ainda tento, como tento.

Carlos Roberto Aricó

PUNIÇÃO

Acorrentado nos sonhos,
preso nas fantasias,
cânticos enfadonhos,
insólitas alegrias.
Medo e esperança.
Partes de criança,
tudo, tanto na dança,
do poeta atormentado.
A sós amado ou desamado.
Caminhar perdido no tempo.
A sós ações mortas.
Vozes tortas.
Acorrentado e sem culpa?
Punição enigmática:
Folhas e folhas em branco.
Profano cada santo.
Atrás de grades,
imenso mundo interno,
solto na alma,
histórias de inferno.


Carlos Roberto Aricó

ENCONTRO?

Rouquidão forte,
quase mutismo,
enfrenta instante,
abismo.
No encontro do sujeito
com o outro,
nada de vencedor.
Visível mesmice.
O rito nunca foi morto.
Visível encontro do entorno e constante.
Agonizantes almas
em todas, tantas almas.
Tolas almas.
Sempre tolas as tantas almas.

Carlos Roberto Aricó

VALOR

Medalhas de ouro.
Velho tesouro do mar?
Monte de besouros,
coleópteros à disposição.
Estação de insetos.
Asas em profusão.
Vive-se, pleno, verão.
Diversão alada,
barulhento nada,
transpassa o sol.
Divertida escuridão.

Carlos Roberto Aricó

CAMINHO DO POETA

Inútil, formas perfeitas, beleza.
Antes, bem antes de ser homem,
sou inteiramente poeta.
Canto, sempre escolhi cantar.
Com ou sem adeus.
Até o pó final, sou poeta.
Palavras me habitam.
Sou razão e desatino.
Não me façam indiferente.
Mesmo em fugas tantas, meio morto,
meio vivo, sobrevivo.
É tarde, mas não me importa.
Meu sangue, minha poesia,
meus sonhos, pertencem a vida
Sobrevivo.
Ora morto, ora vivo,
tão sem aviso,
então claudico, mas caminho.
Sofro, mas caminho.

Carlos Roberto Aricó

É BEM TRISTE

Sombra, infinita sombra, cósmica até.
A miséria: cinzenta.
O arco-íris faltou nas aulas,
cores e a luz eram apenas temáticas.
Estáticas polarizações presentes.
Descoloridas.
Escuridão, falta de luz.
Cegueira seletiva do avesso,
das planícies e colinas
sem nenhum brilho ou relevo.
Todo plano, sem destaque.
Ataque e mesmice.
Atabaques sem índios,
história bem distante,
sem dança, tudo em silêncio.

Carlos Aricó

ASSIM…

Semente encharcada em lágrimas.
Pétalas, muitas cores, sem lástimas.
Flor, fruto ausente.
Passado, futuro, presente: murchos.
Tempo misterioso.
Nostálgicos antecedentes
Apelos, poros, peles,
nevrálgicos.
Estórias indiferentes.
Tristes, obscuras.
Porém permanentes.
Em cada um de nós
os de sempre: insignificantes.
Melancólicos, contentes.
A vida passa,
sempre

Carlos Roberto Aricó

A VIDA

Dia dos Pais.
Das Mães.
Dia sempre do mais.
Humanidade,
se fabricando mais.
Na paz,
Tais, tais humanos,
nós demais.
Sem ais,
sós, enganos,
tolos enganos,
jamais.
Caminhamos.
Nos troncos, nos ramos,
atrás do nada.
E nada se abala mais.


Carlos Roberto Aricó

SONHO

Sonhei-me floresta.
Produzindo poemas.
Palavras, rimas, versos,
pequeno galho.
Sou a folha.
Que fugiu do tempo.
Voou, muito alto voou.
Ninguém percebeu.
Apenas fugiu do tempo.
Pertence ao acaso.
Acaso em significação.
Nada a dizer.
Nada de sentido.
Acordei-me floresta.
Produzindo esperança.
Sem dizer nada, sem medo
Sem angústia, e sem poesia.


Carlos Roberto Aricó

IMPOSSIBILIDADE

Viver, uma guerra.
A realidade tortura,
nossos sonhos,
loucura,
a fuga e o nada
Sempre desabam.
Viver é difícil.
Ofício complicado,
nosso sonho, nossa loucura.
Ilusão.
Cria-se o sim.
Apesar de tanto não.
Nosso sonho, nossa loucura:
água em pedra dura.
Clarão na noite escura.


Carlos Roberto Aricó

ONDE?

Sem pés para o asfalto.
Não desejo cadafalso.
Dirigente máximo das sombras.
Sem nunca existir sombras.
Memória, floresta ausente.
Alma capenga presente.
Caminha sem poder.
Flutua sobre espaço.
Nunca levita.
Ampla luz aflita.
Inevitável desdita.
Por onde caminha?
Salto altos machucam
o asfalto da avenida.


Carlos Roberto Aricó

MANGUEIRA

Mangueira, mangueira
nação verde-rosa.
Lava eterna de palavra,
gramática envolvente
no espinho e na flor,
na rosa flor e no Rosa.
Lava de encanamento,
Harmonia em movimento.
Tudo brilha no momento.
Mangueira, mangueira,
estação primeira,
pátria verde-rosa.
Do Cavaquinho, do Cartola
Da Beth Carvalho
e orvalho na Sapucaí.


Carlos Roberto Aricó

MENDIGO

Fome do tempo,
pobre maltratado,
ensimesmado anda…
otário da vez…
sem voz,
viés do destino,
viés do vício,
pobre e sem nada
esperança acabada,
navega, indiferente asfalto.
Navega nas ruas.
Pés descalços, sem presente,
sem futuro, só vê o mesmo muro
pela frente.

Carlos Roberto Aricó

UM POETA

Inútil buscar
formas tão perfeitas
de beleza.
Antes, muito antes,
de ser homem
sou inteiramente poeta.
Canto, sempre escolhi cantar.
Com ou sem adeus.
Até no pó das impossibilidades,
ainda sou poeta.
As palavras me habitam.
Os versos me habitam.
Tantos e tolos sons
inteiramente me habitam.

Carlos Roberto Aricó

AS RELAÇÕES

Entre o íntimo e o estranho,
as relações.
Mais íntimo menos estranho
as reciprocidades utópicas.
Palavras em mágicas
associações.
Entre o anoitecer e aurora,
as relações.
Entre ser igual ou diferente,
as relações.
Entre ser um ou todos,
as relações.
Entre o sonho e o pesadelo,
as relações.
Entre a verdade e os paradigmas,
as relações.
Muitas associações dignas.


Carlos Roberto Aricó

DORMINDO

Chega a noite.
A escuridão vai chegar.
O poeta e a poesia dormem.
Versos, metáforas, palavras!
Melhor a vida sem palavras.
Sem linguagem.
Sono, sonho, anjos colorindo tudo.
Imagens, arcoirisando tudo.
Luz decomposta, sonhos, metáforas de vida.
A noite corrige equívocos do dia.
Leito e madeira esquecem da floresta.
Árvores em festa.
Parece tudo seresta.
Ser esta.
Daqui à pouco um caminho.
Parte boa e ruim,
a vida é mesmo assim.
Entre a beleza da rosa,
do Rosa e do jasmim.

Carlos Roberto Aricó

EM TEMPO


Entre mim e eu.
Do instante ao eterno.
Passado ou futuro ausentes.
Caleidoscópio sem geometria.
Palavras sem vibração.
Silêncio barulhento.
Vazio e pleno: mesmices.
Sempre ou nunca: mesmices.
Palavras e mais palavras:
língua desconhecida
vibração, nada de significar.
Entre mim e eu:
o infinito e a explosão.
Sombras dançando na escuridão.
Silabas cegas de sentido.
Silêncio, plasma, etéreo.
Harmonia tensa.
Desarmonia imensa.

Carlos Roberto Aricó

MORTO

Lívido, tão branco.
Está fixo, imóvel.
Deitado, vozes e prantos.
Notícias… notícias…
Saudade fugindo,
sempre a fugir
em cada lamento.
Congelado tempo.
Num só dia, toda agonia de séculos.
Branco o morto.
Vestindo só acaso
lívido, imóvel, sem atraso.
Não caminha.
Aguarda a campa.
Aguarda a cova.
Um bom sonho,
sem nada sonhar.
Maratona terminou calada
mais uma vida se acaba
madrugada e nada… nada.
Lembranças, memórias
poemas tristes, histórias.
Notícias… notícias…
Sobre o morto
eternamente absorto
sem carícias.
Da vida não há sevícias,
só um tempo: presente.
O fim, fim etéreo
sempre ausente.
Há choro com mistério
em descrentes vozes
do cemitério
das vozes baixas
sem impropério.
Agora jaz um homem
muito bom…

Carlos Roberto Aricó

RESPOSTA.

Saúde ou ataúde?
Gente que não se ilude.
Compasso de Deus,
espaço de tanto adeus.
Caminha-se contra o destino.
Chamado triste do desatino.
Esperança de vitória,
na luta sempre inglória
de vencer a morte.
Fraqueza ou loucura, cura ou morte?
Poucos marcharão triunfantes.
Depois igual ao antes.


Carlos Roberto Aricó

DEPOIS

Depois da pesca.
Depois da festa.
Depois da seresta.
Só resta a dúvida.
Eterna dívida com Deus ausente:
entre ocaso e o presente.
Um Deus perdido, no meu horizonte.
Enorme Deus, esperança
em toda gente.
Uma dúvida, uma dívida,
como sempre.
Depois da pesca.
Depois da festa.
Depois da seresta.
Ser esta?


Carlos Roberto Aricó

CARNAVAL NA ALMA

Triste ou alegria,
se percorre caminho.
Clima, respirações fáceis,
difíceis, sabedoria.
Continuam igual o dia a dia.
Ninguém machucado.
Sem prece, sem pressa,
sem ave-maria.
Bem leve, só alegria.
Repensa-se poesia.
Vive-se em eterna
harmonia.


Carlos Roberto Aricó

OCASO

Matar toda poesia.
Cansado tradutor de silêncios.
Transcrever ocasos: difícil.
Memória: apenas nuvem.
Matar palavras.
Escrevê-las ou ficar sem elas.
sonha-se e elas voltam.
Já não são inventadas.
Rimas, metáforas, já não inventar.
Reaparecem nos sonhos, na solidão.
Poesias estão podres no chão.
No ar, fazem voo próprio.
Pretensa a autonomia.
Criam asas e voam.
No rio da existência se afogam.
Em fogo: apenas cinzas sem nome.
Nomes queimados,
nomes submersos,
nunca alcançam o real.
Escapar do mundo, de tudo.
Papéis não podem voltar ao branco.
Sujos assim continuam.
Ideias refletem tudo
nesses barulhentos papéis inúteis.
Despir o mundo,
despedir das palavras é fracasso.
Estranha impossibilidade.
Tudo e sempre igual, injusto.
Ainda assim, escrevo, traduzo meus silêncios.

Carlos Roberto Aricó

AINDA VIVO? 
 
Vivo, agonia serena. 
Desespero calmo. 
Nada sei ainda,  
que pena. 
Falo, canto, choro. 
Imploro, e daí? 
Mas... 
 
Absurdamente vivo, 
ao menos o pulso e  
respiração dizem sim. 
A temperatura corporal também. 
Colho algo estranho nesse frio jardim. 
 
Colho tanta história, 
sem glória o implacável fim.  
Com glória, o nada, o vazio, 
ornados com o invisível. 
 
Vivo nos intervalos,  
nos ruídos, nos ritmos,  
na solidão. 
Vivo no silêncio,  
esbarro no chão.  
 
Vivo no tempo paralisado,  
no metafísico vão. 
Falo como sempre  
muito alto. 
Bem alto a conhecida  
indiferença. 
Sem religião,  
sem crença. 
 
Nada importa. 
Janela ou porta,  
abrindo-se para mim. 
Tantas comportas fecham 
minha imaginação. 
 
Vivo, insisto, nunca desisto. 
Pra quê? Por quê? 
Vivo sendo escondido no ocaso,  
perdido no acaso. 
Vivo escondido no ocaso,  
partido no acaso. 
Sem partido algum. 
 
Vivo, descompassadamente.  
Vivo. Gravito meu infinito.  
Gravito em soneto póstumo. 
Gravito, como gravito,  
um malabarismo sempre aflito. 
Significado bem esquisito. 


Carlos Roberto Aricó

JOGO


Defesa ou ataque.
Medo ousadia.
Sonolento o craque.
Gols, alegria, goles.
O copo no chão.

Surdo baque.
Som, tom, ritmo,
triste atabaque.
Num mendigo de fraque.
Milionário no achaque.

Medo ou ousadia,
dia a dia só almanaque.
Fala-se com desprezo.
Palavras pobres,
palavras fracas,
mais um eterno sotaque.


Carlos Roberto Aricó

NEXO 
 

Volto à poesia. 
Lugar das significações. 
Tempo presente para sentimentos.  
Folhas em branco que desfilam  
na eterna esperança. 
 
Dança de tantas palavras, 
Desafiam, também. 
Ritmadas andanças. 
Harmonia, desarmonia. 
Mania do poeta. 
Sagrada alegria... 
 
Volto à poesia. 
Assim um retorno estranho. 
Vida estranha e vazia. 
Métrica, rima, nostalgia. 
Lugar do tempo presente. 
 
Ente perplexo, dor  
e amplexo,  
sucessão de palavras,  
procurando nexo. 
Vida, complexo simulacro. 
Nos saltos acrobáticos. 
Na direção do nexo. 
 (Poesia de minha autoria)

ANOITECE

Há tempo, não desespero,
espero o tempo passar.
Espero e não espero
a morte do tempo
pela eternidade.
Tudo há de chegar.
Saudades do norte,
bússola transparente,
girando viva na gente.
Perdido nesse espaço-tempo,
parado qualquer movimento,
um nada cruel
e tanto esquecimento.
É sem história, meu convento.
Sem palavra, no passo do seu tempo.
Gravito entre nuvens,
perto do firmamento,
navego nos sonhos atento.
Procuro o inexistente.
Talvez insistente,
procuro o vermelho poente.
Na sombra da noite,
com o açoite, bato nas pedras.
Mato flores em cores escuras.
Saudade do Norte,
outro recorte de solidão.

(poema de minha autoria)

EM CERTAS RUAS

Preto no branco.
Branco no banco.
Justiça, dinheiro,
servidão sem paradeiro.
Puta no asfalto
Navega em salto alto.
Salta no abismo.
Bem perto só cinismo.
Bem longe, o tal civismo.
Preto no branco:
que merda!

Carlos Roberto Aricó

CAMINHAR

Sou destino.
Sou desatino.
Aurora, ou poente:
só me façam contente.
Sou destino,
desatino,
só não me façam indiferente.
Com fragilidades tantas,
meio morto, meio vivo, sobrevivo.
Meu sangue, minha poesia,
meus sonhos pertencem à vida.
Então, sobrevivo.
Ora morto, ora vivo.
Caminho, sem aviso.
É bem tarde. Nada importa.
O tempo morre.
Mas, eu caminho. Sobrevivo.


Carlos Roberto Aricó

BELEZA

Uma menina e só encanto.
Um menino agora espanto.
Compõe estranho canto
Aparente alegria mansa.
Almas de criança,
doces crenças de criança.
Flores de luz.
Olhos d’água. Fosforescentes.
Nada de mágoa.
Nada descolorido.
Nada longe do sol.


Carlos Roberto Aricó

PROCURO

Transito
em lugar esquisito.
Persisto
ao saber do mito.
Insisto no esplendor
do circo.
Simplesmente com dor
peço pinico.
Aflito, bastante aflito,
procuro novo rito.


Carlos Roberto Aricó

TIC-TAC

Preso entre presente e passado,
prenuncio a morte do tempo.
O crepúsculo e a aurora,
ao ver a morte do tempo
de mão dadas, caminham
na extensão verde, musgo das pedras.

A eternidade brinca.
O relógio trinca.
E já sem mecanismo,
segundos caem no abismo.


(poema de minha autoria)

NORDESTINO

Muito nordestino desceu,
com tristeza, muita saudade,
erguendo prédios,
fazendo a cidade.

Muito nordestino
criou a vida e a cultura,
sob desatino do sol a pino
que nunca esqueceu.

Sempre muito explorado
em seu destino.
Pobre destino,
o destino do pobre,
do nordestino.


Carlos Roberto Aricó

ENGOLIR

Entre dentes, mastigo forte
a esperança e o vazio.
Engulho só tédio.
Nenhuma palavra boa ou má.
Nenhuma palavra de dor ou alegria.
Alma claudicante,
engulo enorme silêncio.
Não digiro nada.
Sem palavras, pensamento calado.
Na alma, o enorme silêncio.
O alto e o bom som
são hoje trôpegos
para qualquer comunicação.
Parece uma humanidade vazia.
Nenhum habitante.
Solidão e medo.


Carlos Roberto Aricó

PONTOS CARDEAIS

Cheio de Sul.
Cheio de Norte,
de Leste, Oeste.
Cabra da peste,
no sertão, mata, no agreste.
Cheio de Sul, navega-se no azul.
Cheio de Norte,
foge-se da morte.
No Leste, Oeste,
permanece inconstante.
Um brasileiro,
cabra da peste.
Na rota, na trilha,
vai cheio na rota.
A trilha busca sombra.
O sol brilha. Sobra trilha.
O anseio, brasileiro,
caminha.
Caminho de sol,
caminho solto.
No vendaval.
Brinca no temporal.
Caminho de sol,
caminho de sal.
Caminho de Sul. Caminho,
claudica-se,
descaminha-se,
sem carinho, só,
sem vizinho.

Poesia de minha autoria.

TORTURA

Caia…
Muita gente caía.
Outros nasceram caídos.

Suas visões de mundo:
míopes ou cegas na alma.

Caia…
Muita gente decente
caía.
almas e armas
na história.
E nos rituais da memória,
a glória também caia.

Agonizantes,
incógnitas sepulturas
compostas de razão
e loucuras.

Muita gente caia.


Os milicianos
os policiais
prestavam contas
às ditaduras.

Pura invenção
dos medíocres,
onde morreram ternuras.


Poesia de minha autoria.

TAMBÉM

Já, me esquecendo de morrer
vivo e morro também.
Esperança sem lugar algum.
Esperança no tempo, no sem tempo.
Morto, vivo sem lugar.
Vivo sem sol,
brilhos apagados.
Deus ausente.
Deus sem poder.
Desaparecido entre astros,
sem rastros,
vivo e morto também.

Carlos Roberto Aricó

VULCÃO

Até onde se lava, se leve?
Se nada leveza eleva-se
leve tão leve no ar?
Lava do vulcão,
cão indomável.
Magma em explosão.
Fúria incandescente
na terra.
Fúria, fogo, fumaça.
Pedras em convulsão.
Lavar onde
mais nada
se lava.
Lava e lavra
do vulcão:
do cotidiano.


Carlos Roberto Aricó

LUCIANA

Lu… o rei anda nu?
Errei na ciranda?
O rei obedece ou manda?
Lu… o rei ainda nu.
Eu rei, errei, nu,
onde choro e chorei, nu.


(poema de minha autoria)

SER POETA

Ser poeta é
procura insistente
da rima perfeita,
para coisa alguma.

Ser poeta é
procurar desesperado
por métrica boa,
entre tambores dissonantes.

Ser poeta é
unir versos e vozes,
nos contextos do
universo desastroso.

Ser poeta
é o estranho encontro
com o nada, forma acabada
do nada, onde nada
se espera,
do caos sempre agonizante.

Uma ordem
associativa
produzindo sons.
Tons.
Produzindo sons,
vocábulos, palavras
palavras… palavras…


(poema de minha autoria)

UM TOQUE

Não toco nos sonhos.
Tampouco nas estrelas.
Mal toco na minha própria costa.
Permaneço torto,
absorto, tento como
tantos inventar.
Quem sabe agonia.
Inventar a dor, a melancolia.
Fazendo barulho sereno.
Barulho sem eco,
estranho repeteco.
Tento inventar
algo estranho,
dentro de mim.
Assim, quem sabe, até caminho.


(poema de minha autoria)

TENTAR SER O OUTRO

Tentar ser o outro?
Ser igual à maioria.
Ser igual a poucos?
Complicado.
Se parecem ocos.
Igualdade ou diferença?
Triste uma, última crença.
Sempre os mesmos outros.
Aos poucos, aos poucos nada.
Há, sempre há que escolher.
Ser igual à maioria,
ser diferente,
como sempre,
é difícil,
difícil a vida e seu ofício.
Difícil viver em armistício.
No momento ser fenício,
fora da história,
enorme sacrifício.
Ainda que o cotidiano
pareça eternamente vitalício.
Tentar ser outro…


(poema de minha autoria)

FRATURA EXPOSTA

O poeta quis e quis versos.
Eles quebraram-se.
O muro era muito alto.
As rimas, altíssimas.
O silêncio e o branco.
Os mandantes cheios de passado.
O papel mudo.
Tercetos, quartetos impossíveis.
Soneto trôpego.
Cheio de passado.
Ego ridículo, perdido na estrada.
Caminho, nenhum.
Nada.
Futuro e presente impossíveis.
O poeta insiste.
Muitas vezes resiste.
Quis e não quis versos.
Vivendo estranhos universos.


(poema de minha autoria)

Quero matar toda poesia.
Chega de ser tradutor de silêncios.
Transcrever acasos, sentimentos.
O tempo atravessa meu peito.
A memória: hoje, apenas nuvem.

Queria matar as palavras.
Escrevo para ficar sem elas.
Sonho e quase as tenho de volta.
Rimas, metáforas, já nada inventar.
Reaparecer nos sonhos.

Pego as poesias e jogo no chão de terra.
Apodrecem.
Jogo no ar, elas voam e perco
minha pretensa autonomia.
Criam asas e voam longe do chão.

Fazem voo próprio.
Atiro-as no fogo: cinzas.
Cinzas sem nenhum nome.
Atiro as poesias no meio da existência,

elas só parecem afogar.
Nomes submersos.
As palavras não alcançam a realidade.
Escapam sempre do mundo.

O papel nunca poderá voltar ao branco.
Foram sujos e assim continuam.
As ideias viajaram tanto
nesses brilhantes papeis inúteis.

Despir o mundo e despedir das palavras
é sempre um fracasso.
Uma estranha irresponsabilidade.
Ainda assim, escrevo.


(poema de minha autoria)



Cá estamos nós.
Despidos pela vida.
Despidos pela existência.
Nós em nossas peculiaridades.
Nus em nossas peculiaridades.
Solenes em nossas mediocridades.
Vitoriosos em nossas humanidades.
Cá estamos nós.
Sempre e sempre sós
amanhã seremos pós.
Enrolados, em tantos nós.
Procuramos um eterno salvador.
Procuramos algo que nos livre da dor.
Algo que nos livre de tanto sofrimento.
Cá estamos nós.
Sempre e sempre sós,
amanhã seremos pós.
Mesclados com a terra: nós.
Sabedoria e merda.
Tanta merda. Tudo tão merda.
Uma cabeça hoje anda tão lerda.
Saliências, buracos
brincam nos encontros,
criam cotidianos,
na plenitude dos enganos.
Gravitam, engravidam
possibilidades.
Dia a dia,
encanto e desencantos.
Voz, ou pranto
no silêncio.
Gravidez, estupidez
sei lá, gente.
Impertinente acaso.
Jogo de dados raso.
Trazendo
gente,
tangente da inefável
unicidade pungente.
Mesclados com a terra: nós.
Sabedoria e merda.
Sei lá, sei lá…
Tanto fez, tanto faz.

CERTA VIDA

Só é doce no embate vencido.
A vida com chocolate,
cachorrinho que late,
na beleza escarlate.

Arte bem suave.
Até mesmo disparate
Cantam impossibilidades.
A esperança, hoje estandarte,
caminha perto de mim.

Assim se deve percorrer
até diabólico festim.
Ruas e avenidas da
vida com chocolate,
ultrapassando disparate,
vencendo o combate,
o doce fica no fim.


(poesia de minha autoria)

LIBERDADE

Dentro ou fora dos armários, escolhemos.
Não somos mais otários.
Não voltamos aos porões.
Também não as senzalas.
Sempre e sempre,
poder democrático da escolha.
Mesmo que se morra,
não voltaremos à masmorra.
Não, somos livres até sem pão.
Não, autoritarismo, não.
Nunca nos renderemos à autocracia,
à oligarquia.
O poder da democracia
significa escolha.
Ainda que se morra.
Ainda que se morra.
Adeus a qualquer masmorra.


(poema de minha autoria)

MAR DE VIDA

Dor, angústia,
medo, tristeza.
Mãos dadas
juntas, certeza.
Poderosas emoções.
Eventualmente a ginástica.
Sobe em nuvem piroclástica.
Aventura, descaminho
sobra espinho.
Só o leme enfrenta
revoltas, perene.
E nosso corpo: treme.
Nas águas revoltas se geme.
Bem baixinho, se geme.


Poesia de minha autoria.

MINORIA

Sou minoria permanente?
Por enquanto, não ria.
Bom ser representado.
Num dia,
com aceitação.
Nenhuma concordância há
nessa difícil ação.
Só aceitação.
Sou minoria.
Perdi tanto.
Não alegria.
Não tenha vida vazia,
nem barriga vazia.
Isso ainda não aceito.
E pouca gente aceitaria.
Sou minoria.
Um dia talvez,
você sorria,
ao administrar
sem ironia,
um mundo mais rico e
com menos hipocrisia.
Sou minoria,
sempre fui minoria.
Há muito chororô solto,
mas nenhum gato só mia.


(poema de minha autoria)

E AÍ?

Páginas, lágrimas.
Sorrisos indecisos.
Esgrimas, espadas virtuais.
Lástimas, espadas bem reais.
Páginas descoloridas.
Lembranças doloridas.
Memória também boa
À toa, uma vida delirante.
À toa, uma vida vibrante.
Brilho, só brilho.
Imaginário brilhante.
Luz extravagante.
Espelho inconstante.
Verdadeiro brilhante?
E aí?
Tudo alucinante?
E aí?
Vocábulos altissonantes.
Palavras murchas.
E a alma canta.
Uma luz levanta,
e até encanta.
Ao redor o mundo dança.
Agora como criança.,
ao redor de tudo
só lembrança.


(Poesia de minha autoria).

RELÓGIO QUEBRADO

Peito sem respiração.
Tudo dormente.
Calmaria absoluta.
Só lá fora movimento.
Paralisia estranha.
Fim sem recomeço.
Vida sem momento.
Vida sem história.
Memória sem parlamento.
Lembranças ausentes.
Eternidade.
Relógios e calendários
transparentes.
Eternidade e momento.
Parado movimento,
tormento de ausência.
Rodas paradas.
Passo gigantesco.
Tempo sem relógio,
nostalgia sem tic-tac.
Ruas levando ao nada.
Pernas paralisadas.
Instante, só instante.
O eterno gravita.
Nada palpita.
Até a alma parada.
Braços frios.
Só e muito só
o terrível coração
de tantos instantes.


Poesia de minha autoria

CADEIAS ASSOCIATIVAS

Projetos, projetos…
Inventou-se algo.
Alguma letra.
Algumas letras.
São várias as palavras existentes,
que só brilham na alma.

Motivo desafiador.
Dor de tantos já passados.
Amor nas palavras presentes, invenção do acaso.
Perdido, perdidos dados, universo configurado.
Fios, associações, rios livres.
Emaranhados, revoltos
revolta, associações.
Idas, voltas. Nossas precárias lidas.

Letras, rimas, estranhas cismas.
Reflexo, convexo, verso, universo.
Muito colorido ou sem cor.
Matéria escura, natureza ex conjura.
Entre a sombra e luzes
obuses de crepúsculo, cruzes na alvorada.


(poema de minha autoria)

PACIÊNCIA

Quero…
Não desespero,
mas quero.
Chega de “lero-lero”.
Não aceito seu clero.
Volto amanhã, mais cedo.
Só coragem, sem medo.
Quero sem medo.

Nada há de severo.
Quero sem desespero.
Espero, não é legal.
Sei e tristemente espero.
Selvagem não cedo, só espero.
Selvagem concedo, ainda espero.
O que?


Poesia de minha autoria.

UM POEMA

Palavra pesada.
Leve, pluma ou folha.
Associação: poema
fonemas sem direção.
Fonemas voando sem direção.
Silenciar, vale a pena?
Quietude a cena?
Convento, fechado ao vento.
Atento, tento, tento, não consigo.
Persigo o acaso, chão raso
Ocaso livre, desilusão.
Vocábulo em movimento.
Entre o chão e firmamento.
Clarão de lua, nua, minha, nossa, sua,
sem sofrimento.
Sentimento leve.
Atento, há tempo, tento.
Mais um poema no muro do convento.
Sem freira e mesmo sem freira
ainda tento, como tento.


Poema de minha autoria.

NA CIDADE

Se você constrói na cidade,
uma vida ou verdade,
sem trazer felicidade,
só muita imitação,
em contexto covarde,
escapou ileso da mediocridade.

Cada falta de reflexão,
transgride a imitação.
Cada ação mobilizada,
transforma tanta desrazão
em quase nada.

Com dificuldade
se constrói na cidade.
fazendo tanto alarde
onde arde desilusão.

Cidade vazia,
caminha ironia,
arde desilusão.


(poema de minha autoria)

NOVO DESAFIO

Inúmeras folhas em branco.
Mais uma e o desafio.
Mais uma e uma procura.
O nada, o branco, sem limites.
Busco qualquer palavra que nomeie.
Só ousadia e talento podem
produzir vertigem, medo, alegria.
Meu verso, minha poesia…
Capengam. Claro que insisto.
Escorregam entre mãos
paradas, que também esperam.
Cada palavra pode ser um
reflexo da realidade.
E daí?
Cada palavra pode encobrir
coisas. E daí?
A página continua vazia.
Sem letra, com o sempre nada.


(poema de minha autoria)

METAFÍSICO UNIVERSO

Voo sem asas, sem direção.
Em confuso zig-zag desvio de árvores
frondosas, postes altos, prédios.
Pés com autonomia bem anárquica
escolhem o caminho.
Escolhem um mundo só deles.
Cansa, sofre a falta angustiante das palavras.
Das palavras.
Cada palavra estranha, não conhecida
produz uma luta silenciosa que não quero.
Calado, muito calado, não há palavra, nem conto.
Transpiro desencanto. Nada conto.
Extemporâneo espanto, vestido de verso.
O poema tangencia cada problema.
À noite, cantiga tão serena.
Silêncio angustiante, algum medo.
Lua, estrelas, alguma escuridão.
Um metafísico universo sem enredo.
Em estranha ordem, cada brinquedo.
O verso anda nu.
Cada verso ainda nu.


(poema de minha autoria)

CERTO TEMPO

Aurora sofisma.
Entardecer equívoco.
Crepúsculo até alvorada,
vórtice e vértice do nada.
Sofisma de outrora.
Sofisma de outono.
Abandono da aurora.
Vazia, inútil hora.
Tanta, muita héra.
Clorofila eterna,
nessa antiga Era.
Clorofila eterna
parede terna.
Presentes e passados,
bem ou mal separados.


(poesia de minha autoria)

Profissionais da saúde
caminham na amplitude.
Caminham contra tudo
e tantas coisas
se iludem e pouco.
Médico, enfermeiro,
maqueiro, motorista,
no compasso de Deus,
no espaço de tanto adeus.
Caminha, caminham
marcharão triunfantes,
marcharão com alegria,
longe da nostalgia
no atual dia a dia.
Caminham contra o destino
ataúde e desatino.
Pulmões deteriorados.
Pensamos em conflito,
nós, humanos, bem aflitos,
tudo tão esquisito.
Em cada ambulância,
tanta esperança,
e imensa ansia
ansia de viver.


Poesia de minha autoria.

DEFINIÇÃO?

O poeta é sempre altisonante.
Mesmo no silêncio, isolamento
ou abandono. É estranhamente denso.
Ouvidos da alma,
escutam suas invenções,
percebem suas contradições.
Discursos oblíquos, contra dicções.
Falas intempestivas.
Palavras suspeitas.
Realidade objetiva
sem nenhuma realeza.
Sons altos, pausas despercebidas.
E o poeta caminha.
Ruas e avenidas de ocasos,
de acasos de versos ou
pedras energizadas pelo vento.
Versos ou pedras,
pelas tantas turbulências
na alma conflitada.


Carlos Roberto Aricó

FOTOGRAFIA

Ter na mente.
Ternamente.
Tempos idos e presente.
Palavras inúmeras
e o ego contente.

Verdades fotográficas
do tempo ausente.
Dos seres fracos
os onipresentes.

E caminha serenamente
o instante da lente.
Nada de movimento
tudo estaticamente.

Se mente.
Só mente.
Outra a semente.


Carlos Roberto Aricó

MARINHEIRO

Esperança em cada porto.
Vivência do marinheiro
Sem lar algum, absorto.
Tanto e tudo torto.
Parece morto,
permanecer absorto.

Não conta seu dinheiro.
Navega e navega inteiro.
Cresce no chão da alma.
Existir como feito, desfeito.
Sem amor, o primeiro,
do último ao primeiro,
navega esse triste marinheiro.

Paixão extrapolante,
delírio de amor mirabolante.
Cadência afrodisíaca, lascívia,
púrpura, fêmea nua,
demarca certo porto,
na rua do pecado.


Carlos Roberto Aricó

NAS NUVENS

Tédio e agonia,
os artífices do poema
nesse insólito dia.
Escutam-se palavras
ritmadas ao leo.
Significação, altura do céu.
Mundaréu de letras
criam esse universo.
Agora se escuta o verso,
longe, perto, diverso.
Só um momento
sou o momento
pleno de harmonia,
estúpido movimento
nesse dia a dia.


Carlos Roberto Aricó

ILUSÃO

A vida: muda.
Dúvida crescida.
Vida diz saber tudo.
Dúvida floresce, sem alarde,
tarde nada vida.
O eco produz o inominável.
Outro distorcido canto.
Retórico espanto.
Em cena sereia amigável,
em dilema indecifrável.
Pernas, pés, braço, mão
caminham sem direção.
Às vezes voos sem asa,
nas alturas da ilusão.


(poema de minha autoria)

QUEM SOMOS?

Graça, desgraça, ventura, desventura
fazem nessa complexa vida.
Forjando-se dureza e ternura,
transcendentes, espectrais, lágrimas
puras, muito do irreal, olhos brilhantes
até virtuais, mudanças demais.
Traços, compassos, eternos ais.
Somos coloridos pelo sol.
Apagados e muito pela escuridão.
Dias trágicos, meses mágicos.
Comédias e primaveras,
histórias densas, fuga de eras.
Dança doce das quimeras.
Vermelhidão nos poentes,
presságios tristes, desalentos.
Sinos gemem. Almas tremem.
Tanto incerto: morte ou sorte.
Caminhos. Vamos. Quem somos?


Carlos Roberto Aricó

SER BALIZADO?

Ter alegria é colocar muita graça,
até na desgraça.
Sem ser orgulho ou arrogância
em quem vive, por quem passa.
Ter alegria é brincar
com a trapaça.
Entre nós, há gente que faça.
Humilhação, escolha, fazemos sós.
Depois, o tempo originará pós.

Muitas coisas não escolhemos.
Um outro faz, refaz por nós
nossos nós, nossos nós,
sempre apertando mais,
quer destruir a alegria
no suceder do dia a dia.
Várias vezes transparece agonia
mas…
Ter alegria é viver a graça
até na desgraça.
E a vida passa.

Magia, onipotência, força.
O esforço parece interminável.
Honra, autoestima, narcisismo
de vida, tudo interminável.
Principalmente problemas.
Magia, onipotência, força,
tão somente apenas e
se mente apenas.
Há sempre e sempre
as penas: as complicadas e difíceis
penas.


Carlos Roberto Aricó

E DAÍ?

Determinado, mas a esmo,
eu mesmo,
na procura de mim mesmo.
Tomando cerveja.
E comendo torresmo.
Vejo com desprezo
certo aumento de peso.
Feliz, brinco com o tenesmo.


Carlos Roberto Aricó

VITÓRIA?

Mundo do sempre.
Mundo do nunca.
Palavras eternas.
Livre de datas.

Texto da atemporalidade,
contexto sem cemitério,
luzes e luzes na cidade.

Sombras, silêncios, túmulos.
Sempre, nunca,
palavras fortes.

Datas que não datam.
Fazem na vida arruaça.
Quebram nossas janelas,
destroem nossa vidraça.

Cada intimidade fracassa,
tanto vendaval devassa.
Tanto faz dar
ou receber a taça.
Não há campeão algum.


Carlos Roberto Aricó

INEXISTENTE

Ser pedra, Pedro ou Paulo.
Ser José, sem movimento.
Parado e só silêncio,
vendo o tempo passar,
sem significado.

Dentro morto, frio, úmido.
Nas estações do ano,
vejo estático
o tempo passar.

Os ciclos passam.
Contemplação do impossível.
Percorro, impassível.

Vivo. Assim caminho e morro.
Longe dos braços,
singular espaço
sem plural, escasso.

Vivo, percebo, fracasso,
um inexistente e
triunfal abraço.

Um inexistente e
monumental compasso.
Vivo e percebo mais um fracasso.
Vivo preso em ausente laço.


(poesia de minha autoria)

AZÁFAMA INTERNECIDO

Quem será?
Como será?

Meu caminho, meu sonho,
tantos anos só, engano!
E os projetos?
Feitos na dor dos desafetos.

Percorro estradas,
na ingênua esperança,
novo encontro.
E magnífico o encanto.

Quem será?
Como será?
Minha nova prisão.
Claudico em singular chão.

Os anos tão iguais
repetem as mesmices.
O assédio do tempo
continua indiferente.

O tempo congelado
brinca no idêntico.
Transborda no já conhecido,
tempo atual, tempo ido.

Sempre o mesmo tempo ido,
de homens vencidos,
decaídos.
Nas tantas ilusões: vividas.

Agora debilitados
entristecidos,
permanecem
tecidos no vazio,
esquecidos no vazio.
Mortos: morridos.


(poesia de minha autoria)

DIFERENTE

Em tudo só mesmice.
Elegi em tudo o igual.
Em vão algo novo.
De novo a mesmice.
Só mesmice: um final.

A temporalidade eterna.
Todos relógios quebrados.
O mesmo apartamento.
Mesmos móveis e objetos.

Em tudo repetição evidente.
Fracasso absoluto do diferente.
Experiências iguais.
Resultados também... Iguais.
Sempre os mesmos... e iguais.

Cotidiano conhecido.
Segundos idênticos
a outros segundos.
Horas, dias,
meses, anos...

Tudo repetido.
Calendários: os mesmos.
Mesmice, mesmice...
O igual de sempre.
O igual tremulante.

Bandeira do "deja vu"
repetição,
conservadorismo absoluto.
Idêntica ação.


(poesia de minha autoria)

OLHAR

Olhar para cima.
Norte, estrelas,
espaço, sorte?
Olhar para os lados.
Mundo, pessoas,
tolos pecados.

Olhar para baixo.
Um caminho,
um chão.
O possível, a contramão,
pedaço de ilusão.

Olhar para dentro?
Não, não,
chega de olhar.
O tamanho é de vulcão.
Alma atônica,
plasma atômico,
nossa civilização.

Olhar para dentro?
Não e não.
atemorizante
perau sob água cristalina.
Olhar para cima,
o céu, o norte,
gravitando na esperança,
vida e morte na dança.
Claudica-se na andança.
Claudica-se, claudica-se.


(poesia de minha autoria)


COMIGO ME DESAVIM

"Ai o destino dos homens,
ai o destino de mim.
Corta-se a voz ao princípio,
tranca-se o soluço no fim"
(Sá de Miranda)

Comigo me desavim,
escuto som do perigo,
distante algum abrigo,
difícil fugir de mim.

Vago... Gente vadia.
Talvez até fugiria
de mim
se de mim pudesse
partir nesse dia a dia.

Comigo me desavim.
Contigo estranho festim.
Choro sânscrito, latim.
Línguas mortas vivendo em mim.

Comigo me desavim.
E todo lugar um perigo.
Nada bem na paz comigo,
tudo a fugir de mim.

Se por certo acaso,
no ocaso fugir de mim,
serei apenas palhaço,
nunca serei arlequim.
Serei só um homem triste,
e nessas sombras meu fim.

Comigo me desavim.
Transporto dúvidas e sangue.
Festa de brilhante carmim.
Constato as horas passadas,
esse é meu pobre jardim.


*Releitura de Sá de Miranda, In' Antologia Poética"
(poesia de minha autoria)

HERAS

Sumiu da lista,
dos dez mais, confuso demais.
Sofreu, rouco por tantos ais.
Louco, engrandeceu a solidão.
Impossível comunicação, única ação
com jovens de outra geração.

Nas catervas bobas,
lobas e lobos sem dono,
desesperança, abandono.

Alguém foi ao brejo.
Beirando o Tejo. Do Pessoa.
Certa pessoa, um pai, sempre destoa.
À toa ou não, fugiu da luta
por comunicação.

Comunicação entre pedras
em heras acomodadas,
pelo tempo de muitos calendários
em algumas eras,
Restaram só as quimeras.


(poesia de minha autoria)

CRESCER

Há anos espera crescer,
este poeta, pateta
dos desenganos.
Um pateta dos desencontros,
nos cantos e nos contos.

Na poesia, talvez se compreenderia
patéticos prantos,
mesclados à metafísica,
em mística de tantos mistérios.

Há anos, espera crescer
este poeta, tão singular
cretinice do sempre,
tão singular no triste
e também no contente.


(poesia de minha autoria)

NATUREZA

Tanta beleza no arco-íris.
Ultravioleta e infravermelho
colorido só por ausências.

As cores pretas ou brancas gravitam,
o mundo mexe-se,
nenhum auxílio de alavancas.

Luz fraca ou sombra
Certa dança triunfal, foge da lembrança.

Sonho igual realidade
... e uma cidade toda em dúvida,
dividida na dívida do ocaso.
Dádiva do acaso.

Poesia igual matemática?
Inteligência fantástica na informática?
Razões, opiniões, ... sugestão:
viver ou existir, eterna questão.

A natureza segue
independente de qualquer desejo humano.

No fundo, bem no fundo, uma
ordem desconhecida claudica e
corre, no vórtice ao tempo
cada vida escorre,
e o humano quase morre.


(poesia de minha autoria)

OBSERVAÇÃO

Na poesia, uma máscara.
Uma face, um rosto.
Palavras passam pelas paredes.
Mágicos neutrinos.

Fantasmas ultrapassam tudo.
Nomeiam coisas e objetos.
Agora já determinados,
até sabem quem são.

Cada poesia uma verdade,
uma dúvida, uma estória.
O presente brinca no passado.
Passo no paço fazem só espaço.

Sem azáfama navegam
através de portas fechadas,
portos sem mar, sem oceano,
harmonia e conflito, aflitos.
Atritos, estranha saudade.

Nas entranhas dos seres: vaidade.
As palavras passam pela parede.
Neutrinos e fantasmas.
De verdade.


Carlos Roberto Aricó

TRISTEZA

Verdades murchas.
Nada de estrelas.
Nem auroras.
Tudo sombrio, crepuscular.
Inocência obscura,
musa sem clemência.
Ausência e vazio.
Um mundo sombrio.

Na ciência crepuscular,
inocência sentida.
Onda dissonante.
Partida de violência,
idiota inclemência,
que partiu bem longe
do fundo das almas.
Onda dissonante em outro rio.
Amargando desengano
crepuscular o engano.
E bem no fundo da alma,
Há, fora, outra onda em outro rio.


(poesia de minha autoria)

NÃO SEI

Certo fazer atômico,
mobiliza átomos em profusão.
Esquisito para-brisa.
Metáforas e agonia,
vento cortante,
fogo crepitante.
Mas, tudo desliza na calma,
certo fazer anatômico.
Menos proeza, catástrofes conhecidas.
Calma doce do dia, da alma.
Logo, tudo vai deslizar
no silêncio absoluto
dessa esquisita noite.
Sem prazer platônico.
Dissociação sensorial
nenhum sentimento.


(poesia de minha autoria)

QUEM?

Insignificante, disforme,
pedaço de nada.
Única, distante,
noite de pouca luz.

Braços gelados,
pernas frias, inflexíveis.
Pele e alma secas.

Deserto de certa imersão,
cumplicidade com o banal,
só comum sem sonho próprio.

Musa do julgamento impiedoso,
irrefletido, cruel.
Musa das acusações injustas,

articuladas em incerto momento.
Acusações enfáticas.
Justas a partir do medíocre.

​Corpo caído e coerência também caída.
Plano e pleno deserto,
saliência caída.


(poesia de minha autoria)

ACTA EST FABULA

Cultura versus natureza.
O espiritual rasgado
pela realidade,
e o homem sempre desatinado.

Busca-se em cada caminho,
a ignorância,
a mediocridade,
um descaminho,
o labirinto onde se perde.

Nunca há encontro.
Na lucidez de sombras,
brilha um arco-íris
feito de cores desmaiadas.

No hospício
nem sempre no hospício,
um homem acordado
sonha e alucina.
Sem opções reais,
é enorme o desejo de apagar.
O desejo de desaparecer.

E o homem vivo,
coração pulsátil,
razão sem razão,
caminha lento para o nada.

Caminha entre brumas,
para a escuridão,
nada feliz,
nada infeliz.
Só e só caminha.

Escaminho estúpido,
infinita dor.
Descaminho patético,
jardim sem flor.


(poesia de minha autoria)

TRAVESSIA

Vitória do herói.
O Pirro de sempre.
Aos vencedores,
um "saco de batatas".
Tantas ilusões no pódio.
Nos hinos e medalhas.
Vencidos e vencedores,
no mundo mágico,
com ou sem pódio.
Pirro e um imensurável nada.
Em solidão absoluta,
caminha-se para o lugar tão
procurado em tantos cotidianos.
Caminha-se sem emoção,
sem desespero algum.
Caminha-se no chão
entre estradas e estrelas,
caminha-se com ilusão.
Caminha-se nos passos.
Da travessia, passagem, ação.


(Poesia de minha autoria).

COMUNICAÇÃO

Como única ação.
Última ação?
As paredes imensas isolam sentidos.
Impermeáveis muros,
separam tantas almas.
Impossível comunicação.
Ilhados tantos sentimentos.
Ilhadas tantas estórias.
Cada ação solitária.
Mesmice cruel nos falsos encontros.

Nada de encantos,
em cada canto isolado.
Pungente esse coração vazio,
tamborim descompassado.
Comunicação impossível.
Elos de corrente bem frouxos,
corrente falha não paralisa a liberdade.
E o tamborim, faz barulho na cidade.


(poesia de minha autoria)

ASSIM.

​Luto ou gala,
e a vida continua.
Nem se escuta, nada se fala.
Dor, alegria, e um barco navega.
Só ilusão se carrega.
Medo ou esperança,
e os dias passam.
Cotidiano imprevisível.

Dialeto incompreensível.
Futuro absolutamente
desconhecido além do Norte.
Risco de vida morte,
azar ou sorte.
Risco de saúde, doença.
Algo se pensa.
Risco de júbilo, sofrimento.
Verdade ou fingimento.

Auroras e crepúsculos passam.
Noites e dias passam.
Tudo ou nada inexistem.
Assistem ao tempo
transformador absoluto,
perene, orgulhosamente indiferente
a qualquer vã filosofia.
Amor ou ódio passam mesmo

como deveriam passar e passar.
Resta a esperança.
A finitude e sempre nossa eterna inquietude.
Restam as crenças.
Absoluto nada,
nada irresoluto
em luto de tantos dias.

Restam algumas lógicas,
absoluto acaso.
No fundo e no raso.
Restam as letras, as palavras,
os discursos, a civilização,
ou simplesmente ignorância,
na ânsia diabólica de tantos letrados.


(poesia de minha autoria)

OUTRA POESIA

Telhados murchos.
Tortuosas ruelas.
Pracinha pobre.
Um cantinho podre,
na antiga cidade.

Bar, cemitério, empório,
habitantes familiares,
no conhecido ritmo,
nos fortes hábitos,
no novo impossível.

Fantasmagórica repetição
do sempre, mesmice,
do já visto.
Outro dia,
só em outra poesia.
Alegria, só em outro dia.


(poesia de minha autoria)

TEMPO

Buracos enormes
povoam as almas.
Tão vazias no olvido
de tantos adeuses, espantos.
Os inúteis de sempre,
são plenos do imprestável.
Corpos despencam no cotidiano,
desmoronam, desmancham-se
no implacável trabalho
dos segundos.
Corpos de bons e dos maus
também despencam no cotidiano.
Rapidamente.


(poesia de minha autoria)

na foto
passado presente
fato ausente

estaticamente
a forma
estática mente

na mente
estática
da foto
presente ​


(poesia de minha autoria)

MOMENTO

O que sempre se olvida,
tristeza, despedida?
E... segue tensa a vida.
Em cada rua ou avenida.
Dos deuses,
vê-se um novo enredo.
Cada um sem medo
atravessando o rio do degredo.

Entre fremir e frenesi,
ambos tão hécticos,
navega a sorte
nenhum suporte,
no contexto tragicômico
de cada vida
Entre fremir e frenesi,
a sorte: gozo héctico dos deuses.


(poesia de minha autoria)

CRESTA

Cuando mueren
por un instante
las palabras
que tanta muerte dan siempre a la vida
cuando descubrimos el actor que somos
y lo exponemos despojado de sus trajes crepusculares
cuando nos despierta el sueño de soñar
o arrancados del sueno
despertamos atónitos…

JUAN LISCANO

INTERROGAÇÃO

Nunca se sabe o que cada vocábulo representa.
Nem as interjeições.
Nunca se sabe, sobre o sujeito e o outro,
sodalício estranho.
Na realidade, as coisas existem
sem representação.
Mutismo, para uns enigmático.
Héctico espanto. Ninguém vai saber?
E quanta procura!

"Lo imposible hecho posible",
"música que se faz com ideias"
Uma procura sem fim. Eterna viagem ao nada.
Tudo e tanto na realidade de todas coisas.


(Poesia de minha autoria).

NACIONALISMO?​

Muita geografia. Paciência.
Procura-se ideologia. Paciência.
Sempre mal resultado,
Em nostálgica utopia.

Dinheiro malcuidado, hoje agonia.
Trabalho maltratado, trabalho dissimulado,
bem distante da alegria. Tanta geografia,
e um mundo sendo injusto.
Imundo nosso susto.

Fronteira, rios, muros, pontes e nada.
Só partidos, partidas que nos partem.
Verdades à beira do abismo. Razões no infinito.

Não importam os desertos.
Não importa "O Grito".
Munch agoniza.
Indecência ficando próxima da consciência.

Ausência de legítima ordem. Violência.
Tanques. Discursos.
Imprudências, abusos, maus usos.
Do átimo à perenidade.


(Poesia de minha autoria),

CERTO VENTO

Em um corpo, completo,
coberto de nuvem e desejo,
vive certo anjo esperto.
E nesse corpo mais do que certo
coberto de nuvem e desejo,
mora o anjo incerto.

Onde mora agora
o anjo incerto?
Oásis, areia e deserto
e um despudorado vento,
sopra, zune, muito perto.
Tanta nudez bem perto por certo.

Talvez meio torto,
quem sabe tão absorto,
penso nos seios altos, enrijecidos, dilacerantes.
Perfuram meus olhos,
mas ainda os vejo com minha alma atrevida.
Feliz alucinação.
Fugaz alucinação.
Tudo coberto por nuvem.


(Poesia de minha autoria)

VAZIO

No metrô muita gente,
e sempre se espera.
Sem desespero.
Com desespero. Espero.
Uma espera agonizante, cansada,
que não quer mais esperar.

Um metrô inconstante caminha e para,
indiferente à dor de tanta gente.
Trens passando...
transpassados pela cidade.
Cedo ou tarde, tanta gente.
Ainda se espera tanto,
no metrô que desapareceu.
E a voz no ensurdecedor barulho, emudeceu.


(Poesia da minha autoria).

MENINA DE TRANÇA

Menina dos cabelos ajeitados,
tranças de ouro.
É futuro e tesouro.
Sem preço, sem prece, nada peço.

Nem apresso meu passo.
Vejo esse pedaço de amores.
Já não importa a sequência das cores.
Bucólico arco-íris, belíssimas tardes.​
Vejo em você esse grande pedaço
só de amores.


(Poesia de minha autoria)

50%

Mundo cheio,
lascívia e medo,
de sorriso e lágrima.
Erotismo, perigo.
Euforia e dor.

Mundo cheio,
branco e preto.
Cinza impossível.
Certa utopia medíocre,
Claridade, escuridão, no chão.

Semente sem cor,
se mente, sem brilho.
Ou qualquer átomo doente.
Sem outro enredo decente.
No chão, estranhamente.


(Poesia de minha autoria)

UM MAR

Navego em lago revolto.
Há sereias e seios,
quebrando anseios.
eterno naufrago
nas ondas curvilíneas
do seu corpo.

Algo rígido rasga meu peito
e seu coração.
presente abraço
compasso do verão.
Então navego.
Navego em lago revolto.


(Poesia de minha autoria)

ÍCARO

Receber seu carinho.
Quero, não consigo.
Espero por você.
Espero.
Parece meu, seu caminho.

Esperando por você,
nesse chão e nuvens.
Insisto, não desisto, meu voo.
Eu, um Ícaro de braços implumes.

Estendendo minhas mãos,
navegando só queixumes,
observo de uma vez,
dissipar certo ciúmes.


(poesia de minha autoria)

LEMBRANDO​

A memória caminha,
segunda, terça, quarta.
A memória caminha,
quinta, sexta, sábado.
Hoje é domingo,
nada foi resolvido lá trás.
Remorso, memória,
tantas coisas mais:
saem todos pra passear.
Em alguma parte da alma
problemas se repetem.
A memória incessantemente caminha.
Vai ao cinema todas as noites,
não come pipoca.
Vai ao cinema todas as noites
e não come Big Mac.
A memória se alimenta
de temporalidade e passado.


(Poesia de minha autoria).

AINDA POEMA

Em mim,
inúmeros idiomas,
desconhecidos alfabetos,
significações sem fim.
Redomas de letras.

Estranhos significados
em mim,
branco no papel ruidoso,
ruidoso silêncio,
brinca assim.

Hieróglifos.
Ideogramas.
Alfabetos assim.
Letras gravitando
no papel,
em mim,
entre o silêncio
e o universo, assim...

Sodalício, mesma pessoa, enfim.
Em mim,
então viver inúmeros idiomas,
as palavras, as letras,
nas redomas.
No fim...


(Poesia de minha autoria).

TEMPO

Passa.
Apresso passos.
Algo passa.
Uma pedra,
passa pela janela:
nela tudo despedaça.
Copo, taça,
nervosamente estilhaça.

Passa.
Apresso meus passos,
nem tenho pressa.
O tempo voa,
atoa também passa.
Cada minuto passa,
fica uma estória sem graça.
Folhas outonais na praça,
um corpo caído
cachaça.
Outra vez cachaça.

Passa.
Apresso os passos,
na direção do acaso.
No firmamento ocaso.


Poesia de minha autoria.

FLORES MURCHAS

Ruelas estreitas
assombradas pelo atemporal.
Ouve-se às vezes soluços
em contraste com silêncio.
Inventa-se uma eternidade.
Como se inventa o instante.
Difícil de enfrentar a finitude
e suas inúmeras fábulas.
Flores murchas misturadas
com mármore e poeira,
e esperanças.
Também difícil.


(Poesia de minha autoria).

COTIDIANO

Aquele homem,
sem dor,
sem angústia,
alegria sem medo,
sem saudade,
sem esperança,
foi náufrago.

Morreu sem saber de nada
entre lápides, cruzes e obeliscos.
Barulho pesado do silêncio,
aquele homem
sem desejo e sem paixão,
foi somente uma certa utopia
feita com merda do dia a dia.
Sem angústia,
sem esperança, náufrago no cotidiano.
Foi somente uma poesia
sem certeza nenhuma
escapando da maresia.


(Poesia de minha autoria).

ANTIGO​

Com meus olhos,
olho e vejo uns velhos óculos.
Sofridos pelo tempo,
gastos pelo olhar de meu pai.

Viveram certamente muitas histórias.
Óculos de tantas cenas,
tantas reflexões, tanta unicidade,
e disparates.

Mediaram com acertos,
com erros, o mundo interno.
Com objetivo, parte da realidade
foi observada por lentes envelhecidas.
Foi interpretada por lentes envelhecidas.

Apego e desapego misturam-se no fazer deles.
Simplesmente velhos óculos,
com muitas histórias mortas.
Simplesmente velhos óculos
gravitando na atemporalidade.
Perdidos nas gavetas e nos calendários.


(Poesia de minha autoria)

LOGOS

Ainda navego,
sem rota estabelecida, na metafísica:
uma cadeia de vocábulos desconhecidos,
poema vazio.

Página branca, sem nexo,
sem verso, sem sexo.
Um soneto morto.
Absorto navego torto.

Imagens caleidoscópicas.
Absorto, debato-me na metafísica, no porto.
Navego e navego.
Às vezes, escuridão
calma de um lago.

Existo, insisto,
despedaço-me.
Por que a vida?
Por que pensar
se tantas contradições permanecem
na barulhenta praça da dúvida?

Por que tantas interrogações?
Margeio o abismo do sonho.
Tristonho, vislumbro
e cismo com imagens revoltas.
Navego ou voo.

Mesmo eu voo?
Tento decifrar-me.
Acaso e ocaso dançam, sem flecha,
sem lança, sem cupido.

Procuro alguma lógica.
Algum logos, referência.
Religião ou ciência?
Ciente do non-sense, estremeço.

Creio que mereço navegar sem rota.
Sem significação e na solidão torta.
Tudo parece não ser nada,
nessa vida com sentido e desrazão.

As palavras cada vez mais distantes
das coisas. Tão distantes da significação.
As palavras como espelhos da mentira.
Logos, logos, em cada mão.
E uma procura sempre malsucedida.
Os prólogos eternos.


(Poesia de minha autoria)

MOMO

Carnaval.
Carne, festa,
floresta sensual.

Carnaval...
Desfilam-se em avenidas
eróticos seres,
destilados no álcool,
destilados na ilusão.

Carnívoros, músculos fortes
em solidão,
corpos, rostos,
peitos, quadris.
Ardis em profusão.
Homens e mulheres
dançam feito imbecis.

Mulheres homens
vorazes,
brincam no carnaval
de muitas carcaças.
Arruaças em avenidas,
em outras praças,
cheganças, despedidas,
compradas ou vendidas.

Navegam vigas,
navegam os vãos,
carnaval em festa,
e nos tons.
Espaços ocupados
até exaustão.

Suporte na viga,
transporte no vão,
vida do Rosa e do Tom.
Vê-se sem beira,
festa da cumeeira,
em águas de março,
em muitos textos e mágoas.

Troco na prece,
troco na poesia,
trecho empresta,
texto sem contexto,
pretexto
na vida do Rosa e do Tom.

Carnaval
carne, festa
estúpida ilusão.
Traço no texto
da cumeeira
troço em servidão.
Homens e mulheres
batucam no chão.

Desfilam-se nas
avenidas, eróticos
seres destilados
no álcool,
transpassados em ilusão.
Transpassados no erotismo,
de mão em mão.


Poesia de minha autoria.

LAVRAS

Palavra forte: vida ou morte.
Deus lavra os caminhos.
Lavra os desatinos.
Dor, sofrimento, vazio.
Corpo e também alma,
assinalam descaminhos.
Alívios difíceis.
Ausência de paz.

Brinca-se impassível com a sorte.
Estranha-se certo Norte.
Prosseguir difícil.
Estradas estranhas sem vício.

Alguém brinca impassível,
determina ou joga os dados.
Nunca se observam cuidados.
E nós, complexos humanos,
apodrecemos docemente.
Brincamos de modo impassível,
entre nuvens e astros.


Poesia de minha autoria

A NATUREZA E A LINGUAGEM

Tanto existe sem metafísica.
Árvores, peixes,
montanhas, casas,
crianças, índios.

Sem metafísica:
plantas, ursos, planícies,
castelos, estantes, sons.
Alvorada, estrelas,
poentes, noites,
luar, sol, crianças, neves.

O som das palavras,
as palavras impressas.
Tintas azul ou preta,
sobre brancos papéis.

Caracteres ordenados,
impressões despóticas,
na criação de inúmeros logos.

Tradição verbal,
tradução escrita,
formadas e deformadas
pelos indivíduos,
e claro,
pela metafísica de sempre,
como muitas outras coisas.


Poesia de minha autoria.

PASSADO

Estranha a recordação.
Olhos, cabelos, peitos, pernas, rostos,
tocaram uma vida.
Almas, mãos, ideologia, ultrapassaram alguém.
Memória diminuta.
Esquecimento grande.
Tanto, tudo ou menos talvez.
Recordação suprema.
Estória pequena,
história sem texto,
contexto estranho,
cadeias associativas sem nexo,
sem sexo, sem neutralidade alguma.
Estranho com rugas serenas, mágoa serena.
Sonho impossível,
alma louca.
Um mar revolto no passado.
Persiste monumental desafio
a qualquer recordação.
Eternos anseios.
Navegador e náufrago
procuram o sonho do improvável.
Recordação acena.
Recordação com bandeira,
Recordação plena,
alguém ainda encena.


(poema de minha autoria)

METAFÍSICA

Teodiceia escatológica
arranha o silêncio e a vida.
Deus e o Diabo
brincam com o humano, com o desumano.

Juízo final.
Afinal de contas.
Castiga e abençoa,
soa alegre, soa triste.
Em espaço lírico,
impossível religião.
Entre criar ou repetir,
Deus e Diabo
Brincam com o destino de tanta gente.
Deus e o Diabo brincam,
lutam, sofrem, choram.

Ondas iluminadas.
Ondas em trevas.
Remanso
na extensão da calma
de tantas águas,
de tolas mágoas.

Diz Deus:
teodiceia e graça,
responde o Diabo:
teodiceia sempre escatológica,
nos castigos,
e plena de incertezas.
Ambiguidades mostram contradições
sobre estrada dialética.


(poesia de minha autoria)

TANTA POSE

Organizo o piso, no piso do paço.
Feito atleta de aço.
Com a mais decidida força,
piso no piso do paço.
A posse, a pose, misturadas nesse espaço.
Presságio do trágico, do trôpego,
transitam entre o podre e o pobre.
Traço de princípio.

Trasso e martírio.
Espaço sem colírio.
Embaço no mistério.
Estúpido passo,
passo de posse tola.
Possesso, pressão messiânica de tantos passos.
Insistem a pose e a posse.

Na prece sem pressa,
desfigurada apoteose,
osmose sem matéria,
overdose de miséria.

Na prece sem pressa,
peço talvez muito.
Tantas peças paralisadas
já não se encaixam.
Enquanto pessoas
desfiguradas passam

Logos, legos,
brinquedos de deuses
no tráfego da vida.
Transcorrer da dúvida.

E ainda piso, no piso do paço.
Sem direção,
meus pés não sabem caminhar.
Sem direção,
pés paralisados no tempo
movimentos ausentes.


(poesia de minha autoria)

RECOMEÇAR

É preciso não ter medo.
Fazer da vida novo enredo.
Recomeçar, recomeçar...
Viagem.
É preciso não ter medo.
Seguir viagem.
Desprezar o passado.
Utopia em nova imagem.

É preciso não ser rocha,
nem rochedo.
Novo existir
sem segredo.
Abandonar a paisagem.

O que foi,
hoje é brinquedo,
estranha miragem.
É preciso não ter medo.
Muita coragem.

Deixar de lado
toda bagagem.
Seguir viagem.
Recomeçar, recomeçar...


(Esta poesia é de minha autoria).

MESMICE OU DIFERENTE?

Como condenado nunca punido,
matemático de sombras,
escombros em mesmice,
lusco-fusco no medo, no desejo.

Assim caminha a humanidade.
Assim caminhamos nós.
A prece inútil.
A descrença inútil.

Esperança e nada misturados.
Não pensar.
Lucidez estúpida.
Não pensar.
Seguir, seguir sempre.
Não pensar.

Orgia intelectual
em rendez-vous de trevas.
Mesmice e diferenças.


(Essa poesia é minha autoria).

NÓS​

Todos nós somos vida.
Todos nós somos dúvidas.
Acaso e determinismo.
Metáforas do evolucionismo.
Somos soluções e problemas.
Tudo ocorre em nossos emblemas.
Mas, somos e não somos.
Auroras, crepúsculos,
esquálidos ou com músculos.
Todos nós somos vida.
É claro, muito claro ainda.


(Poesia de minha autoria).

UMA FLOR

Seus cabelos,
meus desvelos.
Esqueço-me do Rosa.
Eternas veredas.
Esqueço o "nome da rosa",
trafego em alamedas.
Seu rosto: lindo.
Decomposto pela sorte.
Eu procuro na morte

um destino vadio.
Esse ser vazio,
também vadio,
procura um norte.

Seu corpo paralisa minha memória.
Andar de Gradiva
prenuncia sua glória.
Nos encontros, nus os encontros.
Fusão de almas,
horas bem calmas.

Crepúsculo ou aurora,
sem espinho agora.
Visão bela do mundo.
Nascimento da rosa.
esqueço-me do Rosa
esqueço o "nome da rosa",
mais um simples desabrochar de rosa.

Pena a pena,
só a ilusão da rosa.
Apenas poesia,
não há mais prosa.
Nem agonia.
O silêncio já pode ser outro.
Outra a órbita,
outro o voo entre astros.
Outro o mergulho no infinito.


(poesia escrita por mim).

ESPERANDO

Letras claras.
Letras nítidas.
Dançam na página em branco.

Que pena!
Nada de poema.
No desejo
daquela morena.


(Poesia de minha autoria).

ACASO

Telômeros homéricos.
Telômeros curtos.
Mementos do tempo.
Momentos do calendário.
Sucessórios, aleatórios
Tormento nos oxímoros.

Oxítonas dissonantes.
Estranho dicionário.
Morosos baratinos.
Estranhos desatinos.
Membrâmula: choro, silêncio.
Meros momentos em tempos
de travessia.
Meros movimentos.

Telômeros e transtornos.
Mermar das mesclas.
Virtude, hoje mexinflório.
Monocórdio ritmado
das vidas.
DNAs amarrados
em telômeros.

Complexos cromossomos.
Nas almas, nos somas.
Combinações infinitas.
Pulsátil determinismo.
Míssil e heroísmo,
generalidades ou abismo?
Paz ou hedonismo.


(Poesia minha autoria).

O PEDINTE

A mão estendida do mendigo
tiraniza a rua.
Desigualdade nua.
A tristeza aumenta nesse dia.
Cada verso transpira agonia.
O poeta balança entre auroras
e crepúsculos.
Sabe do silêncio
habitando espelhos.
Silêncio, flores?
Só abandono pobre,
em reflexos tristes.
Vazio e noite fria.
Angústia cresce dia a dia.
A mão estendida,
tiranizando a rua,
tristemente continua.


(Esta poesia é de minha autoria).

SANTIAGO​

Todo fué para nosotros,
noche y sombras de sangre.
Todo mató muchos sonrisas.
Todo fué solo luto y teniebras.

“Un pueblo sin memória
es un pueblo sin futuro”
Ocho es poco y sin memoria
no puede haver humanidad.
No hay felicidad.
Más, no se desaliente.
No se dice Allende.

Entre el ocho:
personas con angustia caminan.
Entre el ocho:
vida o muerte.
Derribando cuerpos,
golpea todos los silencios,
que te esperan.
Solo y solo,
dolor y sangre.
Tanto para desfalecer.
Madres atravesadas por la angustia.
“Um pueblo sin memoria es un pueblo sin futuro”

La muerte va derribando cuerpos y almas.
Pinochet, usted no entiende:
no si puede decir Allende?
Hoy es muy fuerte el viento blanco y la corrupción
en todo el mundo!
Dice Borges:
“Los enterraron juntos.
La nieve y la corrupción los conocen.”
Todo fué para nosotros, noche y sombras de sangre. Adiós democracia.


Carlos Roberto Aricó

LINGUAGEM ANTIGA?

Único o palimpsesto.
Pergaminho,
arquivo,
flutuando
na história e em estórias.
Coletivo,
individual,
hoje gravitam.
Caleidoscópio mágico,
às vezes incolor.

Amores múltiplos.
Cores,
dores, flores,
amores.

Nenhuma morada ética.
Memória e história
hoje brincam.
Nenhuma morada épica.
Nenhuma percepção óptica.
Memórias e histórias
Caminham hoje,
em perdidas representações.

Mundo interno e realidade.
Tudo palimpsestado
nas imagens arquetípicas
de um humano duvidoso.

Resiliência.
Falta de qualquer motivação diferente.
Mãos dadas e imensidão.
Palimpsesto perdido
multidão.

Pergaminho, letras em profusão.
O tempo zomba do eco.
Repeteco em impressões
de estórias.
Arquivo vivo nas histórias.
Espelho vivo nas memórias.


(Poema de minha autoria)

SIMPLES DEMANDA

Quero pedir à noite
uma boca vermelha,
bem desenhada
por lábios carnudos.

Quero pedir à aurora
seios firmes e invasores
da boca,
depois da cumplicidade dos sorrisos.

Pedir quadril marcante,
marcado para doce maternidade.
Uma cintura de causar inveja,
desprezando alegre,
dimensões de outra
cintura bem feita.

Quero pedir
braços e pernas,
mãos, pés,
pedaços de erotismo,
queimados sol a sol,
na simplicidade dos trópicos.

Tudo como o diabo gosta
e os moralistas de plantão
só fingem não gostar.

Nesse mundo
de tantas aparências,
ainda resta o orvalho:
o trabalho simples
das madrugadas
na luz de certas manhãs.

Assim, talvez já nada peça,
além de pedir à noite
o preparo silencioso
de mais um orvalho.


(Poema de minha autoria).

SOCIEDADE PÓS-INDUSTRIAL

Subjetividade, modismo,
abismo entre o igual,
descompasso no diferente.
Cada ente na civilização
hoje é semente da contradição.

Marcas, grifes, elites
originam-se no poder,
liberal ou totalitário.
O poder ultrapassa tudo.
Contudo,
cada pessoa morre,
agoniza
um pouco.
Com ou sem poder.

A mão do mercado,
mãe do poder,
ultrapassa tudo.
Individual ou coletivo,
brilha
o arquivo sórdido das diferenças.
Arquivo cínico das falsas cenas.
Cenáculo de desilusão.
Alusão em quase nada.
Valores ausentes, aparentes.
Ilusão em quase tudo.

Valores caóticos
e poderes despóticos.
Marcas, grifes, elites.
O humano drogado ou triste
a tudo assiste,
Algum insiste em viver,
nunca se desiste do poder,
aviltando ou iludindo
cada ser.
Existências combalidas,
entre diferenças e homogeneidade,
nessa civilização tão contraditória.


Este poema é de minha autoria.

TRANSPOSIÇÃO

Ventura, prazer, desejo
enunciam paraíso.
Eu nada vejo.
Já não conta juízo.
Sofre
e sofre o sertanejo
no destino rude
sem gracejo
No canto,
em tantos cantos,
não há encantos.
Florescem espantos.
Ventura, prazer, desejo,
volúpia sem pejo.
Inútil festejo.
Dia a dia
A barriga vazia,
de cada sertanejo.
Ventura, prazer, desejo.
Só festa nesse injusto cortejo.


Esta poesia é de minha autoria.

O PODER

Disse me disse:
política, porcaria, politicalha.
A mesmice.

Disse me disse:
a posse, a pose, a podridão.
Tolices.

Disse me disse:
trapaça, tradição, traição.
Meretriste.

Tudo enorme imundice.
Sempre merdice.
Sempre merdice,
em solene história triste.

Ideal de cretinice:
notícia triste, história triste.
Até o sol desiste.


Essa poesia é inédita e de minha autoria.

O OUTRO LADO

Outra a margem.
Estranha margem.
Chego lá.
Certeza, chego lá.

Hoje,
daqui dias,
ou muitos anos.

Chego lá,
pois ousei ser vivo.
Células muitas,
em harmonia.

Às vezes,
o descompasso.
Desequilíbrio.

Chego lá, sem pressa.
Passos lentos,
braçadas lentas.

Braçadas, passos,
harmonizam travessias.
Outras vezes
quase afundo.

Mas a margem continua lá:
dizem meus mortos,
em tempo de tristeza.

No contratempo angustiado,
entre lágrimas
ou esperanças.

E quase nada se espera.
Agitação de ontem.
Calmaria de ontem.

Hoje, tudo mais devagar,
passos medrosos,
passos claudicantes,
Trôpego.

Depois,
já na outra margem,
eu vejo...
Eu penso, sei lá…


Essa poesia de minha autoria é inédita.

SER POETA

"Ser poeta é a minha maneira de estar sozinho"
Fernando Pessoa

Quero ser o que não fui.
Ser gesto
sem movimento,
carícia paralisada.
Desejo
sem ardência,
emoção bem gelada.

Quero ser o que não fui.
Paraíso sem Pasárgada.
Inimigo de qualquer rei.
Sem me saber só,
sem saber que sei ou só serei.

Quero ser o que não fui.
Nada de poética.
Nada de evocação.
Nada de lirismo,
nem impensada ação.
Ser tantas pessoas,
ser tantas bandeiras.

Quero ser o que não fui.
Bandeira e Pessoa
seguem, atemporalidade.
Eu vi Bandeira sozinho no tempo.
Perdido na vida.
Eu vi o Pessoa sozinho na vida.
Perdido no tempo.

Quero ser rio,
quero ser sempre rio e correr,
serpenteando acasos e ocasos.
Estrada insólita,
caminho sempre incompressível.
Só, nas curvas dos rios.


Essa poesia de minha autoria é inédita.

PICADEIRO

O palhaço faz rir,
faz chorar.
Brinca passo a passo
nos enredos tragicômicos.
Exalta dor e sorriso.
Brinca e brinca de Deus.
Presença ou ausência dos seus.

Seu adeus continua sempre,
indiferente à plateia.
Dança nas emoções, no mistério.
A sério mistura tudo.
Mistura vida com morte.
Alegria à tristeza.
Pobre com nobreza.
Brinca e brinca de Deus.

Engrandece os cotidianos
há muitos anos.
Vive nas cores do humano.
A face colorida oculta outro humano,
desconhecido.
Relativiza todas as regras possíveis.
Ironiza o óbvio,
sem nenhum ódio.
A civilização não gosta dele
ou faz de conta:
brincando sempre como palhaço.
Com energia
sem cansaço.

Sucessão estúpida de guerras.
Selva de descomunais feras.
Esfera visível do ridículo.
O palhaço brinca e brinca de Deus.
No adeus ao picadeiro,
terreiro de suas preces,
palco de seu choro,
terreiro de seu riso.
Sorriso e caras.
Sorriso e caretas.
Passo e no compasso
do trágico,
do alegre palhaço,
um triste palhaço.
Só ironia.


Carlos Roberto Aricó

DOMENICO DE MASI
"Malgré la merde, je croix."

Maurice Bejart

Rede versus
linha de montagem,
e segue uma extensa viagem.

Campo ou indústria?
Rural ou urbano?
Conflito cotidiano.
Sujo manto desliza o capital.
Nada,
e nada santo.

Em cada atalho,
o trabalho tenso
versus ócio.
O sujo negócio
do ladrão.
E em cada sócio.
luta de classes, sem sacerdócio.
Tempo algum para o equinócio.

Enorme o grupo
dos explorados.
Pequeno,
seleto,
grupo dos eleitos.
Repetem-se
cotidianos desfeitos
os mesmos defeitos.

No afogo dos males,
criam-se as regras do jogo.
Luta de classes dissimulada.
Harmonia desejada.

A verdade fracassa,
em solene arruaça.
Quebram-se vidros,
quebram-se vidas.
Impossível caça.
Tantas ideias,
tolas ideias
misturam-se em vidraça.

Black-blocs da vida
misturam-se
a dívidas e dúvidas.
Mascarados ou não
misturam-se com nosso espanto
procuram o canto da libertação.

Na linha de montagem,
uma eterna viagem.
Campo ou indústria.
Rural versus urbano,
Processo insano.

Trabalho versus ócio.
Ócio versus trabalho?
Muito se mistura
nesse baralho.
Sempre o enorme grupo
dos explorados.
Bem seleto o grupo
dos eleitos.

A sutil e dissimulada luta,
estabelece as regras
de cada jogo.
No afogo morre-se.
Do hipotético sacerdócio,
floresce um bom negócio.

E nós de alguma forma,
somos sócios desta civilização,
repressora do ócio.
plena de ódio.
Nada mais é santo.
No manto cruel, conflitos.
Nos acobertam, nos acovardam
indiferentes.


É a primeira vez que essa minha poesia é publicada.



ONDE SE APRENDE?

Misturar-me com todas,
com tolas, à toa.
Atordoado,
já não sei se sou.
Ocupar-me do menor espaço
entre humanos. Doce espaço
no compasso sensorial vencedor.
Intimidade, sem sonhador.

O passo do erotismo
nada ensina,
Corpos equivocados.
Só os mesmos pecados.
Sabedoria pobre.
Rostos, pernas,
peitos, mãos, bocas molhadas.
Enfaticamente
busca-se algo.

Alguma verdade
na vertente dos corpos?
Memória silenciada pelo nada.
Nada a aprender,
só desvario dos encontros.

Nada a aprender nos encontros
normalizados pela civilização.
Nada a aprender no certo,
no errado.

Vida das possibilidades,
vida dos sonhos.
Vida de tolos pesadelos.

Misturar-me com todas,
espertas ou não,
atordoado
já não sei quem sou.


Essa poesia, de minha autoria, é inédita.

REFLEXÃO

Espelho, lugar inabitável,
só reflexos e reflexos sós.
Rostos alegres ou antigos rostos.
Desgostos, escassos sonhos decompostos,
a postos, impossível espaço.

Inimigo da memória,
vidro, cristal,
fracasso e glória,
reflete um só momento
ou toda história.

Superfície silenciosa,
ocioso espelho mágico,
das miragens, dos mitos, do mundo,
refletindo até a exaustão
pálidos momentos da percepção.


Poesia do livro “Luz e Sombra”, de minha autoria.

COTIDIANO

Dentro de mim,
complexo labirinto.
Sem Ariadne,
minotauros múltiplos.
Início ou fim utópicos.
Tão desejados.
Tão inexistentes.

Perdido caminho.
Perdido descaminho.
Parede intransponível,
entre mim e o outro.
O outro interno:
caricatura.

Minotauros múltiplos
dançam.
Muito alegres
só dançam.
Hoje escapei!
Morro de espanto,
na chatice de sempre.


Essa poesia, de minha autoria, é inédita.

CANTILENA

Uma luz na retina
descortina a menina
nos olhos triste da bailarina.
Tristes olhos mar
de gotas tão serenas
são pequenas lágrimas
nos olhos-mar da morena.
Meu eterno marejar,
submersa cantilena,
tristes olhos mar
de ondas tão pequenas.


Publicada no livro "Luz e Sombra", escrito por mim.

MINHA PSICANÁLISE ​

A psicanálise tropeça
no destino humano,
mas, ao menos,
tenta compreendê-lo.
O desejo será sempre
enigma e esfinge.
O desejo será sempre
o algoz de Édipo,
cada vez mais trágico.
Museu de tudo e do nada.
História e estórias.
Importa revelar
as tramas do inconsciente.
Trapaças, lapsos, atos falhos
no teatro do impossível,
que muitas vezes
se pretendem razoáveis,
acima das vicissitudes da emoção.
Tragédia nos acessos da dor.
Comédia nas periferias do prazer.
Estranha mistura de amor e morte.
Apolo e Dionísio
sem lugar no metrô,
sem site na internet,
sem rugidos no zoológico.
Carne e Verbo, afeto e escrita,
em algum lugar extrafísico.
Parte da verdade
habita espelhos
e labirintos.
No lugar do nada,
absoluta exclusão dos valores:
silêncio dos significantes.
Representações ilusórias, pobres.
Importa revelar
os dramas do inconsciente.
Cada ente merece
interpretação diferente.
Às vezes, ouço o rumor insólito
do significante.
Um minotauro
feito de sombra atiça-me,
assombra-me. ​


Publicada no livro "Luz e Sombra", escrito por mim.

ALQUIMIA

Lucidez ou loucura?
Insuportável estupidez
na rua escura.
Aventura conspícua, perene,
utópica, etílica,
descuidada, despudorada mistura.
Ignorância, poesia, cultura:
ao gosto da criatura.


Publicada no livro "Luz e Sombra", escrito por mim.

COSMONAUTA

Cosmonauta en la noche espacial,
solo y solo
enigmas y sombras
danzan en mi pensamiento.
Sin novedad,
todo se vuelve alrededor,
en las mismas constelaciones.
No soy aire ni soy estrela.
Camino sonámbulo
oyendo el rumor silencioso
del sueño.


Poesia publicada no livro "Luz e Sombra", de minha autoria.

ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU

Possibilidade e acaso,
nesse chão e arena,
sobrevivem ao correr da pena.

Sem pena do determinismo,
casual cinismo,
o futuro já nos acena.

Apenas jogo da vida.
Apenas jogo da dúvida.
Sem dúvida,
sempre os dados fazem cena.

Poesia publicada no livro "Luz e Sombra", escrito por mim.

AGORA SEI? ​

Quando
dançando no ar
mais nada for,
com absoluta leveza de beija-flor,
voarei.
Voarei entre nuvens e pássaros.
Voarei.

Eu rei,
infinitamente voarei.
Voarei entre estrelas
de galáxia distante.
Uma vertigem flutuante.
Agora sei!

Poesia publicada no livro "Luz e Sombra", escrito por mim.

MEMÓRIA CONCRETA

Na foto
passado presente
fato ausente
estaticamente
a forma
estática mente
na mente
estática
da foto
presente


Poesia publicada no livro "Tempo contra tempo", escrito por mim.

A MÁQUINA

no instante
fui item
do instante
seguinte

inconstante
hífen
parágrafo
seguinte

dois pontos
na alma
de cada instante
outra folha
futuro distante

entre linhas
espaço duplo
a folha voou
com a brisa
onde está?
a alma de cada instante?


Poesia publicada no livro "Tempo contra tempo", escrito por mim.

O PSICANALISTA​

enterrei minha vida
entre quatro paredes
ouvindo, e ouvindo estórias
de pessoas aterradas
encerrei minha vida
cercada por muros,
o campo cerrado
habitado por enganos,
sempre e sempre o mesmo Édipo
incapaz de criar outro
destino.


Poesia publicada no livro "Tempo contra tempo", de minha autoria.

EU

sou sujo e puro
louco lúcido
também estúpido
ateu ou místico
dialética é meu dístico
coerente e contraditório
do silêncio ao falatório
sou poeta, cientista
animal e gente...
e na corda rota dos limites
o eterno equilibrista
com arte de ser artista
sou vivo, reto, morto,
direito e às vezes torto
pleno de dogma e dúvida
sou a força onipotente
e antiforça inválida
em minha colorida
existência pálida


Poesia publicada no livro "Tempo contra tempo", de minha autoria.

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